quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Soneto ao senhor do sonhar


Pertinho do virada, fecho o ano com um homenagem.
Sem mais delongas, eis o poema que escrevi...






segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Da Pérsia, com carinho

Aproveitando a visita que o presidente do Irã, Ahmadinejad, fez mês passado ao Brasil, vou falar sobre algo relacionado ao seu país, como o conheci por meio de Marjane Satrapi, em sua obra Persépolis.
Esta é uma daquelas obras despretensiosas, mas reveladoras, ou pelo menos o foi para mim. Assim como O Caçador de Pipas nos mostra um Afeganistão tão parecido e ao mesmo tempo tão diferente do nosso país, Persépolis faz o mesmo ao nos aproximar tanto do povo persa (e não árabe, como no Caçador de Pipas), paradoxalmente mostrando-nos o quão distante aquele país está do nosso também. Paralelo que traço também com o livro De Cuba, com Carinho, nas palavras da blogueira Yoani Sánchez (que retrata por sua vez sua própria ilha): "Se não fosse pelo véu negro sobre o cabelo e a presença constante da religião, pensaria que Persépolis conta a história da Cuba onde eu tenho vivido. Especialmente no que se refere à tensão, à constante menção do inimigo externo e à hagiografia em torno dos caídos". Marjane Satrapi começa com sua infância, em que estava durante a Revolução Islâmica de 1979, quando, de um ano para o outro, subitamente se viu obrigada a vestir véu em público e se viu afastada de seus amigos meninos na escola. E nos conta a sua visão pessoal, de uma menina, sem entender tudo aquilo que era obrigada a aceitar. A sorte da menina era que seus pais tinham uma boa condição de vida, eram cultos e estudados, e tinham uma consciência política muito forte, um pensamento à frente e moderno que muitos de seus conterrâneos e contemporâneos não possuíam. Sendo assim, a menina não cresceu alienada e foi educada lendo sobre Descartes, Marx, Gandhi, Fidel e muitos outros, além da boa educação em francês que obteve, futuramente importante em sua vida.

Uma infância normal, assim como a de qualquer garoto daqui do Brasil, com suas brincadeiras, seus amiguinhos, sua família. Mas marcada pela presença da ditadura repressora do regime pós-revolução. Interessante ver as restrições e proibições impostas, como o não uso de gravatas, símbolo ocidental, e a exposição mínima do corpo da mulher.

E assim acompanhamos o desenvolvimento autobiográfico da autora, numa época tumultuada por que passava, apresentando-nos o dia a dia no Irã enquanto crescia. Como conheceu um tio, de quem se orgulhava, e como este foi executado como se fosse "um espião russo". Como se desfez de alguns sonhos de infância quando a embaixada norte-americana foi fechada ou quando fecharam as universidades do país. E a tão conhecida guerra Irã-Iraque, que perdurou durante tanto tempo e acompanhou uma boa parte de sua vida.

Enquanto o país se acabava (e acabava com seus jovens) na guerra, Marjane nos mostra o mundo por trás de tudo, a vida real, como sua primeira festinha de rock, vestida de punk, em seu auge na época. Isso é um ponto alto da história: mesmo com costumes por vezes tão distintos dos nossos, em muito o povo iraniano era igualzinho ao brasileiro, ou a qualquer outro do mundo. A portas fechadas, as famílias faziam festas e chamavam os amigos, nas quais bebiam vinho, coca-cola e ouviam música para dançar. Vemos como, mesmo com a repressão do regime contra tudo o que fosse ocidental, e portanto decadente e desmoralizante, ainda havia um "tráfico ilícito" de fitas cassete de Michael Jackson, da Madonna, do Pink Floyd, ou até mesmo de hambúrgueres e salsichas. Engraçada, de tão cotidiana, a passagem em que seus pais trouxeram escondidos um pôster do Iron Maiden para a menina.

"O que é isso? Michael Jackson, o símbolo da decadência?"
"É Malcom X, líder dos negros muçulmanos americanos."
"Está zombando de mim? É o Michael Jackson!"
"Quem? Não conheço..."
"Naquela época o Michael ainda era negro."

Como todo regime totalitário, o iraniano usava de dissimulação e falseava fatos, fingindo vitórias nas batalhas contra o vizinho Iraque e enaltecendo grandes bombardeios ao inimigo. O pai de Marjane, desconfiado, sempre verificava a veracidade das informações oficiais ouvindo a BBC. Num desses bombardeios, uma casa no fim de sua rua foi destroçada, e assim ela teve seu primeiro contato direto com a morte.

Com a linha-dura do regime se fortalecendo cada vez mais, seus pais decidem mandá-la para a Europa, onde ela vai estudar em um liceu francês em Viena. A partida foi dolorosa para pais e filha. Aqui começa outra fase de sua história, em que passa a morar sozinha, ainda adolescente, num outro continente, sem saber falar o alemão, sendo muitas vezes discriminada por lá.

Na Áustria ela conheceu gente de todo lugar do mundo, e atraiu interesse de muitos, "alternativos", por já ter conhecido a guerra e já ter visto a morte de perto. Interessante a relação dela com um pseudointelectualoide revolucionário-wannabe: o garoto adorava posar de superior em cima de todo mundo, expondo a futilidade da vida capitalista de todos frente ao grande panorama mundial, e toda aquela retórica ideológica vazia e demagógica a que nos acostumamos ouvir na universidade (sempre tem um tipinho assim), mas ficava pianinho perto da Marjane. O que ele tinha só de teoria, ela tinha vivenciado na prática, e perto dela costumava sempre calar a boca.

Lá ainda ela passa pelos descobrimentos da adolescência, descobrimento do próprio corpo, da sexualidade, do mundo, das drogas, etc. Muito boa sua reação à "primeira festa anarquista" de que participou. Nada de engajamentos de revolucionários, apenas um bando de jovens e adultos brincando e correndo uns atrás dos outros... Hilária também a passagem em que demonstra para nós as transformações pelas quais passou entre os 14 aos 18 anos, e como seu corpo "se deformou", alterando proporções e tudo o mais. Quando foi visitá-la, sua mãe chegou mesmo a não reconhecê-la. O desenho de Marjane é simples, sem grandes pretensões, mas funciona para ilustrar sua história.

Sozinha e estrangeira, com a ajuda das drogas e de decepções amorosas, acompanhamos como ela foi ao fundo do poço e quase faleceu. Ela decide então voltar. Com tanta bagagem já adicionada em seu histórico pessoal, e com tão pouco em comum com aquela garota que partiu, a volta foi dura e penosa. Acostumada a certas liberdades europeias não permitidas no Irã, a readaptação também foi difícil. Principalmente com relação à falsa moralidade existente do regime. Por exemplo, enquanto corria para pegar um ônibus, os guardiões da revolução a pararam e pediram para parar de correr, pois "seu traseiro fazia movimentos impudicos":

Andando por Teerã, não se via cartazes de promoções espalhados pelos prédios, mas cartazes exaltando os mártires de guerra. Suas amigas, adultas agora, todas maquiadas, com penteados e permanentes, querendo parecer as mais ocidentais e modernas possíveis, mas escondendo tradicionalistas enrustidas por dentro, invejosas das experiências vividas por Marjane na Europa, algumas vezes tratando-a como puta. Depois de alguns anos, não se sentindo mais parte daquele lugar, ela decide ir morar na França, com o apoio dos pais e da avó. Mas desta vez a despedida não foi em tom de tristeza, mas em tom de alegria. Assim é Persépolis, a história de vida de uma iraniana que passou pela revolução, passou pelo exílio, e passou pelos costumes duros de seu país para com as mulheres. Uma história de vida, cheia de drama, mas também de humor, como qualquer outra, repleta de realismo e veracidade, mas cujo contexto nos apresenta uma bagagem cultural enorme sobre o Irã e o povo persa, e de certa forma sobre o mundo da época.

"Quanto mais o tempo passava, mais eu tomava consciência do contraste entre a representação oficial do meu país e a vida real das pessoas, aquela que acontecia atrás das paredes."

Marjane mora hoje na França, de onde escreveu e desenhou Persépolis, primeiramente em francês, mas que depois foi traduzido para vários idiomas, tornando-se conhecida como a primeira quadrinhista iraniana. Persépolis virou animação em 2007, recebendo prêmios em Cannes, e sendo indicada ao Oscar de melhor animação. Recentemente, dois jovens iranianos, com a autorização de Marjane Satrapi, utilizaram os desenhos de Persépolis e criaram uma versão "2.0", denunciando as fraudes nas eleições presidenciais do Irã, em que venceu Mahmoud Ahmadinejad (por coincidência, se não me engano o presidente iraniano esteve no Brasil no dia do aniversário da autora).


- Livro sugerido 1: O Caçador de Pipas, de Khaled Hosseini.

- Livro sugerido 2: De Cuba, com Carinho, de Yoani Sánchez.

- Blog sugerido: Generacíon Y (www.desdecuba.com/generaciony).

- Animação sugerida: Persépolis (Persepolis, 2007).

- Jogo sugerido: Prince of Persia.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Justiceiro - em zona de guerra





Recentemente assisti ao novo filme do Justiceiro... Não ficou sabendo? Talvez porque não tenha ido para os cinemas, mas direto para o DVD. E mesmo o DVD não teve lá muita divulgação... Enfim, eu assisti. E entendi porque não tinha ficado sabendo da existência do filme antes: em geral não fazem publicidade de filmes tipo B.


Violência gratuita e surreal

O filme abusa de cenas de pancadaria desnecessária e violência impossível. É tosco! O Justiceiro arranca cabeça de um com uma facada, enfia a lâmina na parte de cima do crânio de outro e mata mais um, na mesma cena, enfiando o pé de uma cadeira na cabeça dele com um chute. Sentiu?

O filme todo é um clichê de anti-herói, desses que a gente assiste anos depois e morre de rir. Chamo a esse tipo de filme de paródia não-intencional: o cara trabalha todos os elementos de clichê e exagero que poderiam classificar o filme como uma paródia, só que ele não teve a intenção de fazer uma paródia, mas a de fazer um trabalho sério. Não faz mal, a gente ri da tosquice do filme assim mesmo, principalmente quando a roupa dos atores e toda a forçação na história já não forem considerados comuns daqui a alguns anos. Tem uma cena realmente hilária: uns capangas estão brincando de le Parkour no alto dos prédios (até agora não entendi qual é o propósito disso dentro da narrativa) e um deles, quando pula dando uma cambalhota no ar, leva um míssil em pleno ar! É sério. Até os outros capangas que estavam com ele arregalam os olhos, sem acreditar que o Justiceiro realmente foi tão tosco assim. Não está acreditando? Veja por si mesmo: http://www.youtube.com/watch?v=RUv1NfYGYyU

Retalho e Coringa

O que foi bom no filme, na minha opinião, foi uma referência ao Coringa interpretado pelo Jack Nicholson (imagino que tenha sido uma referência. Se não foi, o roteirista tem uma incrível habilidade em fazer coisas não-intencionais, para o bem e para o mal). Particularmente gosto de referências, não sei se deu para notar aqui no blog, re-re-re. O vilão do filme é o Retalho. Durante uma luta entre ele e o lunático... digo, o herói... digo, o anti-herói tosco... É o seguinte: no início do filme o Justiceiro acerta um mafioso, que cai em um triturador de vidro. Isso o dilacera por inteiro. Um cirurgião reconstrói seu rosto. Em seguida, o médico o desenfaixa. O mafioso usa um espelho de mão só para ver o quanto ficou desconfigurado. Com sua sanidade abalada, ele adota o codinome Retalho. Reconhece essa história de algum lugar? Em vez de um triturador de vidro, um caldeirão com produtos químicos? Em vez de Retalho, Coringa? Já na aparência, Retalho se assemelha mais ao Coringa interpretado por Heath Ledger.

Em resumo, minha opinião sobre Justiceiro - Em zona de guerra é a de que ele segue o mesmo padrão do filme do Justiceiro lançado há alguns anos, só que praticamente sem enredo, defeito que tentam preencher (sem sucesso) com cenas brutais de sangue desmedido.

Filmes recomendados: Ruas de Fogo (excelente exemplo de paródia não-intencional nos dias de hoje). Justiceiro – Em zona de guerra (excelente exemplo de paródia não-intencional de amanhã).

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Bravas e destemidas referências

Assisti recentemente alguns episódios do desenho animado Batman - os bravos e os desteminados. Está passando atualmente no SBT e no Cartoon Network. O desenho é mais lúdico, o Batman retratado é mais bem-humorado e divertido, assim como suas histórias. Não é lá grandes coisas, mas é legal. O que tenho gostado mesmo são as referências presentes em alguns capítulos.

Rei Arthur

No primeiro episódio que assisti, Batman e o Arqueiro Verde foram convocados por Merlin a salvar o reino de perigosos feiticeiros. Tem toda aquela história de "somente um bravo guerreiro conseguirá tirar a espada Excalibur da pedra" e tal. Legal a referência a uma das obras literárias medievais mais conhecidas.


Sherlock Holmes

Houve um outro episódio em que Batman encontrou o detetive mais famoso da literatura: Sherlock Holmes. Como se sabe, a capacidade de investigação, dedução lógica e inferência empregadas pelo personagem de Conan Doyle influenciaram e influenciam até hoje os detetives retratados em diversos meios. Personagens dos seriados de hoje sofrem clara influência, como o detetive Monk e, há suspeitas, até o satírico médico House, já que Conan Doyle inspirou-se em um investigativo professor de medicina que teve para criar Holmes. Certamente o maior detetive dos quadrinhos também foi influenciado pelo detetive mais conhecido da literatura.

Planeta dos macacos

Em outro episódio, Batman se depara com um futuro apocalíptico, em que os humanos foram dominados por outros animais que também desenvolveram inteligência. Tudo obra do gorila Grodd. Macacos em guerra e os humanos submissos no futuro da Terra... isso é uma referência à série de filmes Planeta dos Macacos, ficção científica das telonas que teve uma releitura de Tim Burton há poucos anos. Arrisco dizer ainda que, em determinada cena, quando um gorila gigante vai ao chão e é preso por cordas, isso é uma referência à maneira como o "homem-montanha" foi preso pelos pequeninos humanos nas Viagens de Gulliver.


Musicais

Existe um episódio que é claramente uma homenagem aos musicais. Um inimigo chamado Music Meister (não traduziram o nome) tem o poder de comandar as pessoas com sua melodia. A partir daí todos os heróis e vilões meio que viram marionete de suas vontades. Alguns, como a Canário Negro, entram na cantoria. Diversas cenas são cantadas e até encenadas pelos personagens, nessa referência ao gênero musical. Veja um exemplo: http://www.youtube.com/watch?v=bjh9XmE22cw


Autorreferência

Meu episódio preferido. Batman conhece o vilão Batmite, que tem o poder de alterar a realidade. Em uma determinada cena, ele modifica o próprio Batman, representando várias fases do herói (como, por exemplo, o Batman retratado no Cavaleiro das Trevas e o retratado no antigo seriado de TV. Veja essa cena em http://www.youtube.com/watch?v=n7K-cgiN0NE. Quem acompanhou a Crise Final deve conhecer essas diferentes abordagens do personagem, que estão dentro dos planos para 2010 no trabalho de Grant Morrison). Mas a autorreferência não para por aí... O Batmite convoca a presença dos fãs do Batman para saber a opinião deles. Na convenção, um deles levanta a mão e diz que o Batman retratado, enfrentando monstros e afins, não é o Batman dele. Os roteiras se juntam para dar uma resposta, lida pelo Batmite: o personagem é tão rico que pode ser retratado de diversas formas. O Batman mais aventureiro e bem-humorado é apenas mais uma visão. Metaliguagem pura! Essa é exatamente a visão retratada no desenho. Como vocês puderam perceber, eles até fizeram um resgate de inimigos que não tem mais lugar no universo DC devido a suas inverossimilhanças. E já apresentam sua defesa aos fãs que só gostam do Batman amargurado e obcecado em por ordem em uma cidade hipercriminalizada.


Como disse, o desenho não é lá uma obra-prima, mas vale a pena assistir de vez em quando. Principalmente quem assiste a animações só para ver as referências presentes nelas.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Li... e fede!

Argumento e arte. Em HQs, devem andar juntos, pelo menos para mim. Há aqueles que são exímios nos dois, como John Byrne e Walt Simonson (vide Quarteto Fantástico e Thor deles). Mas vou falar de outro autor/desenhista. Ou melhor, de um suposto “autor” ou “desenhista”: Rob Liefeld. E falar mal, muito mal. Mas hoje em dia é muito fácil falar mal dele. Em qualquer site, fórum ou blog você acha um milhão de detratores do cara. Ahá, então não era só eu que, lá nos idos da famigerada década de 90, achava o cara um zosta?!? Que alívio saber disso! Outros concordavam comigo também! Volto nesse assunto depois. Mas vamos lá, se você não sabe de quem eu estou falando, ou não concorda comigo, aqui vão algumas provas que sustentam a minha opinião. Retirei de um site em inglês muito bom, sarcástico, hilário, que lista os 40 piores desenhos do Liefeld (http://progressiveboink.com/archive/robliefeld.html), mas peguei somente alguns e dei umas opiniões pessoais a mais (confesso, não vou ser nada parcial aqui).

Para entender melhor minhas críticas, é bom um conhecimento, mesmo que mínimo, sobre anatomia, perspectiva e tal, nada muito técnico ou profissional, basta você já ter lido alguma HQ antes (que não seja do Liefeld, claro) ou visto alguma foto de um ser humano ou ter a mínima noção intuitiva de física do mundo em que você mesmo vive. Com vocês, Rob Liefeld:




Vou começar devagar. Reparem em como Shatterstar enfia a espada em Masque. Olhem para sua mão esquerda. Pois é, ele "empurra" gentilmente a espada através das costas de seu adversário com a palma da sua mão, delicadamente. Passem ao quadrinho de baixo. Além de atacá-lo ajoelhado (mas não no mesmo plano em que estão todos os outros personagens da cena, ou isso ou então todo mundo que está atrás está simplesmente flutuando), Shatterstar ainda ergue o inimigo no ar com a ponta de sua espada, sem condições mínimas de apoio! Alguém consegue explicar como essa espada não quebrou no meio? Não vou nem comentar o tamanho da lâmina, que cresceu uns bons 30cm de um quadro para outro, reparem. Mas vou falar do brilhante fundo criado por Rob. Riquíssimo cenário, não? Eles deviam estar lutando dentro de alguma galeria de arte abstrata com paredes assim...



Olha o Shatt aí de novo (Rob gostava mesmo de sua criação)! Respondam rápido: que mão foi decepada, a direita ou a esquerda? Esquerda, né? Tem certeza? Olhem bem para ela... quantos polegares ela tem?!?! Sério, se não houvesse a imagem ao fundo do carinha com o pulso esquerdo vazando sangue, alguém realmente diria com absoluta certeza que essa mão voadora era uma mão esquerda? Outra, das duas uma, ou Shat tá pulando pra atacar seu inimigo (e de um modo bem esquisito, eu diria, com as pernas abertas e tal), ou seu inimigo realmente tava lutando com ele ajoelhado? Princípio do terceiro excluído, ou você assume a primeira proposição como verdadeira, ou a segunda... ambas bem inverossímeis. Não acaba por aí. Olhem a espada. De qual perspectiva vocês estão olhando-a? Sua lâmina está perpendicular ou diagonal em relação à empunhadura? Parece que ela está chapada, bidimensionalmente, e de jeito nenhum aparenta estar num ângulo de acordo com a empunhadura.



Bom, nessa nem vou comentar no uniforme ridículo da senhorita de quadril bizarro voando ali em cima (po, dourado com marrom? e com um balde na cabeça???). Só quero que me respondam: de onde saiu o terceiro braço desse descamisado aí? Fala sério, saiu de dentro da barriga ou é impressão minha? Esse pobre coitado, além do defeito teratológico em sua anatomia, também é míope ou ele está partindo pra cima de alguém contra a luz do sol? Ou talvez ele seja mesmo oriental e eu esteja enganado... Nããããã! Nota dez pro cenário aqui também, estilo "estou dentro da Matrix vazia".



Quase que todas as mulheres desenhadas por Rob são bailarinas. Ou pelo menos adoram andar em allongé ou elevé ou en pointe (sei lá, não entendo muito de balé): por que diabos as duas estão na pontinha dos pés? Falando em pés... esse é o ponto fraco do nosso querido Rob. Na verdade, ele tem muuuuuitos pontos fracos, mas pés são o ponto mais fraco dele, se é que isso é possível. Veremos mais disso nas próximas figuras, mas por enquanto se atenham aos pés da Dominó lá no fundo. Isso mesmo, aquelas tripinhas horríveis e deformadas em que finalizam as pernas da branquela lá do fundo são, ou eram para ser, pés. Reparem que nenhuma das duas veste calçados (o colorista até que tentou ajudar Rob e pintou os pés da Dinamite de rosa, mas não conseguiu nos enganar, conseguiu?), mas mesmo assim, nenhuma delas apresenta dedos nos pés... sinistro! Falando em Dinamite, ela tá mesmo tomando uma chave de braço da própria toalha ou essa é a posição normal que um braço direito fica quando se está se enxugando? Pode ser noia minha, mas eu realmente acho que naquele braço direito da loirinha está parecendo uma mão esquerda... sou só eu? Voltando à Dominó e sua alongada "quebra-quadril", meu amigo, que área pubiana vasta ela tem, não? Em alguns cursos de desenho da figura humana, é ensinado que a distância entre o umbigo e o fim da área pubiana seria equivalente a uma "cabeça" (já vão vocês se medindo aí, né, hehehehe), mas no caso em pauta Rob quis dar-lhe mais sensualidade, e a deixou com uma distância de duas cabeças!



E olha a área pubiana aí de novo! Meu Deus, Rictor botou uma pá dentro da cueca mesmo? Para fazer sucesso com a Dinamite, será? Rob deve ter gastado tanto tempo desenhando essa área enorme aí em cima que, quando chegou na hora de desenhar a mão esquerda do infeliz, ele disse "ah, cansei, deixa qualquer coisa por aí pro colorista preencher". E, po, Dinamite, não tinha outro lugar pra se sentar não, tinha que ficar logo em cima do armário? Se bem que, pra mim, não parece que ela está bem sentada no armário não, diria que ela está meio que flutuando pousada imponderavelmente sobre ele. Agora vamos ao quadrinho de baixo e... Santos macacos devoradores de humor vítreo, Batman, o que aconteceu com os olhos de Rictor? Aonde eles foram parar?



Bom, vamos lá. Alguém consegue explicar o porquê de uma arma ter duas saídas para balas? E é uma arma bem grande, certo? Como Cable consegue segurá-la sem ter o apoio de sua mão esquerda? Afinal de contas, onde diabos está sua mão esquerda? E quanto à sua mão direita... falem a verdade, parece mesmo que ele está segurando o gatilho dela ou apenas a apoiando no colo? Po, de que adiante usar uma arma desse tamanho se não for usá-la? Ele nem sequer ameaça ninguém segurando-a assim, ele nem sabe onde fica o gatilho da arma para poder tentar dispará-la! Quanto ao Shatterstar logo abaixo, parece que Rob o desenhou de mão fechada e depois pensou "hmmm, seria uma boa dar uma arma para ele também, para Shat não se sentir diminuído com o armão do Cable" e daí desenhou porcamente um cano de arma em cima da mão dele. Ou isso ou a empunhadura da arma tem a finura de um canudinho. E quanto a essa bola no lugar do bíceps do cara, que p#$*a é essa? Fora que seu antebraço parece atrofiado, ainda mais perto de um bíceps dessa circunferência (meçam a distância do ombro até o cotovelo, e do cotovelo até o punho, não parece incongruente?). Ao fundo, Dominó com sua quebradinha de espinha...



Nada de errado nesta, não é mesmo? Boa pose, de ataque, mostrando dinamismo, e mesmo com o corpo dobrado, em movimento, Feral ainda mantém suas proporções corretas. Rob acertou desta vez? Não sejamos tolos. De onde está saindo o rabo de Feral mesmo, hein? Po, tá saindo da bunda dela! A cauda é um prolongamento da coluna vertebral, que no caso dos humanos é reduzida e limita-se ao cóccix. Ou seja, deveria sair do fim da coluna, seguindo a linha medial das costas, e não da nádega direita dela!!!



Já mencionei o problema do Rob com pés, certo? Vejam bem aí em cima o que acontece quando ele resolve desenhá-los... tadinho do Franklin, ganhou patas de elefante. "Olha o passo do elefantinho..." Mas Rob é um cara espertinho, e sabiamente usou artíficios para evitar de ter de desenhar pés nos quadrinhos seguintes. Nada como uma rocha bem colocada ou um corte entre o quadrinho de cima e um quadrinho de baixo para esconder os pés dos personagens! Olhem agora para a mão direita do vilão: não há um dedo faltando ali? Falando em mãos, reparem nas mãos de Franklin (que pelo jeito adora correr de braços abertos): acho que Rob desenhou a cena inteira, depois pensou algo como "eu queria fazer o Franklin mais modafóca, pra ele não ficar só correndo como uma menininha... é, acho que vou botar uma arma nas mãos dele, vai ficar legal" e tascou uma arma na mão do moleque, obviamente desenhando-a por cima do desenho original. Não havia intenção original de ele segurar uma arma, isso é nítido. Tanto que, no último quadrinho, por preguiça ou puro esquecimento, Rob não desenhou a arma mais. Ela desapareceu! Hilário é esse "thoomthoomthoom" de onomatopeia pra indicar Franklin atirando perigosamente contra seu perseguidor sem nem olhar pra trás. Muito bom, Liefeld!



Aqui vemos mais um exemplar do ótimo gosto de Liefeld por uniformes, e seu padrão básico é: meia-jaqueta, luvinhas transadas, golinha no pescoço, uso do branco e A ENORME ÁREA PUBIANA! O cenário de fundo, como de praxe, são só rabiscos abstratos. A grande jogada de Rob aqui é não mostrar os pés de ninguém! Uhu, ele conseguiu, meia página toda e nada de pés para se desenhar, graças a um joguinho com cenário e perspectivas. Parabéns, Rob, reconheceu seu erro e o evitou, saindo de bandinha. Olhem para a mão direita de Deadpool, abaixado, e me digam se seus dedos parecem ou não pernas de aranhas. Todos com quase a mesma espessura, e aparentemente invertebrados. Falando em mãos, a mão direita do Arma X (de pé) está fechada... mas parece não ter dedos. De algum modo, para mim não bate o volume da mão do cara com o braço inteiro dele, a proporção está errada. É como se ele estivesse com a mão aberta, mas não tivesse mais dedos. Impressão minha só?




Olhem o pé do Cable! Coitado, tá com o pé deformado (aqui Rob esqueceu de pôr uma pedra ou um matinho providencial na frente dos pés dele e teve de desenhá-los...). Subam o olho pelo corpo de Cable, cheguem no quadril e continuem até seus ombros. Opa! Não parece que o quadril dele é maior que seus ombros? É quase uma reta só, ou será que Cable está com culotes? Quanto ao que ele carrega debaixo do braço, aquilo ali é uma arma ou um jornal? Sua mão direita aparenta mesmo estar carregando alguma coisa, mesmo que seja esse jornaleco high-tec? E sua mão esquerda... peraí, cadê a mão esquerda??? Tanto nesta quanto na figura anterior, os personagens estão de frente para o sol de novo (acho que ele deve achar que olhinhos apertados quase fechados tem um quê de cara de mau, sei lá).



Não, essa daí não é a mulher-elástica ou qualquer coisa do tipo (apesar de seus braços parecerem estar sendo esticados também). Ela também não está morrendo tendo sua coluna partida ao meio. Eu não sei dizer se ela é contorcionista, mas não creio. É erro de perspectiva mesmo! Se dividirmos a imagem ao meio, veremos duas perspectivas diferentes (façam o teste, cubram uma metade e observem a outra, depois troquem). Baseado na metade de baixo, a senhorita estaria sendo vista meio que lateralmente, em diagonal. Esperaríamos, então, vê-la um pouco de perfil, a parte direita de seu corpo semiencoberta pela esquerda, em primeiro plano. Baseado somente na metade de cima, podemos afirmar que ela está sendo vista de cima, pelo alto, com a "câmera" logo acima de sua cabeça. Sendo assim, a metade inferior de seu corpo deveria estar encoberta pelos seus ombros e seios. Mas isso num mundo onde a física funciona exatamente como a nossa. No mundo de Rob Liefeld, uma mulher consegue ser vista ao mesmo tempo por cima e pelo lado, sem se quebrar todinha. Cara, Rob é um verdadeiro cubista!



Aqui podemos ver como uma mulher se parece para Rob. Um verdadeiro alienígena. Podemos ver um cinto no lugar onde deveria estar (ou caber) um estômago, braços mais largos que seu próprio abdômem, a espinha quebrada num ângulo humanamente impossível, para parecer sexy, eu acho. E uma coxa que vai se avolumando e ganhando diâmetro à medida que se aproxima mais do joelho. Guardei essa imagem para o final, mas caberia ter copiado a frase do site original em inglês: "O que você precisa saber de mais importante antes de ler sobre os terrores que Rob Liefeld desenhou é que ele nunca viu ou conversou com uma mulher na vida e não tem ideia de como elas parecem nem como o corpo delas funciona". Revejam a imagem acima. Corrobora a frase?



Finalmente, a imagem que eu mais gosto: a Vovó América! Fala sério, você olha para essa imagem aí em cima e diz "puta, mas como o Capitão tá forte e musculoso!" ou diz "meu, o Capitas tá gordinho, hein? E essas tetas aí?". Eu ainda não consigo acreditar que Rob tenha finalizado este desenho e pensado "cara, me superei dessa vez, tá perfeito", e, pior ainda, não consigo acreditar que a Marvel comprou essa bagaça! É, pagou por essa imagem! E caro! Mas sabem por que o bandeiroso tá parecendo tão gorducho assim? Vou tentar explicar. É a tentativa de Rob de ser cubista novamente que está nos dando essa ilusão (po, o supersoldado é o ápice da forma física humana, ele não pode estar uma bola assim, é somente uma ilusão). Questão de perspectiva: o Capitão ou está de perfil, ou está meio de lado, mas não os dois ao mesmo tempo. Inicialmente, aparentemente, Rob queria fazê-lo totalmente de perfil (tudo bem, virando um pouco o rosto para nós), mas pecou ao tentar desenhar toda a estrela em seu peito. Se o Capitão estivesse mesmo de perfil, só poderíamos ver seu peitoral direito, que cobriria a visão do esquerdo e nos privaria de ver todo seu símbolo. Se, pelo contrário, ele estivesse meio de lado, aí sim veríamos também seu peitoral esquerdo e o restante da estrela no peito, PORÉM, sua cabeça não deveria estar tão atrás, deveria estar mais deslocada para o centro de seu corpo, mais para perto da estrela (a não ser que seu pescoço surja ou emerja a partir de seu ombro esquerdo). Tracem uma linha imaginária a partir da nuca do Capitão até abaixo para tentarem visualizar onde estaria sua coluna vertebral. Percebam que essa linha dividiria o escudo do América quase bem no meio da estrela do escudo. Então, daí vem a pancinha, pois se as costas dele estão lá atrás do escudo, e se seguirmos a distância até o fim de seu abdômem, veremos Capitas com uma avantajada circunferência abdominal... Abaixo, em uns trinta minutinhos gastos no Paint, fiz (toscamente) uma comparação entre as duas perspectivas, tentando "consertar" o desenho de Rob. Reparem que, na primeira figura, tentei mantê-lo de perfil, apagando seu lado esquerdo que não poderia ser visto deste ângulo. Ao lado, na direita, tentei manter a estrela em seu peito completa, dando a entender que ele estava se virando para nós, mas para isso tive de deslocar (lembrem-se que falei toscamente) sua cabeça mais para o centro de seu corpo (se traçarem a linha imaginária novamente a partir de sua nuca, neste caso perceberão que sua coluna cortaria apenas uma ponta da estrela de seu escudo). O deslocamento é sutil, mas perceptível. O resultado é uma verdadeira dieta no nosso herói (cortei um pouco do excesso de deltoide para manter a harmonia do desenho, eliminando uma "bola" desnecessária em seu ombro), mas paradoxalmente uma maior masculinização do mesmo (eliminando as tetinhas). Comparem qualquer um dos desenhos abaixo com o original de Liefeld.


Preciso falar sobre a imagem do Fanático no início do post. Rob, em sua imensa sabedoria anatômica, o desenhou com algo em torno de 50 dentes. Não estou brincando, tentei contar e perdi a conta, é algo em torno de 50 dentes mesmo, confiram! Agora preciso explicar a minha imensa satisfação ao ver que havia outros que concordavam comigo que Rob Liefeld era ruim, muito ruim. Durante uns poucos meses da minha vida frequentei um curso de desenho da anatomia humana, ou algo assim. Lá havia muitos bons desenhistas, outros nem tanto, mas a grande maioria adorava HQs, de heróis principalmente, e adoravam bons desenhos. Mas havia muitos - sim, eu disse MUITOS - que idolatravam Rob Liefeld. Em pleno curso de desenho! Na época as revistas X estavam no auge, e enquanto uns ressaltavam Jim Lee (eu, por exemplo), outros ressaltavam nosso querido Rob. Eu pergunto: cadê esse pessoal, hoje? Porque hoje é muito fácil falar mal de Liefeld, muito fácil mesmo. Não se vê ninguém falando que já o defendeu, parece que 100% dos que liam quadrinhos na época não gostavam do cara. Não era assim. Cadê aquela galera, numerosa até, que pagava pau pro cara? Hoje não gostam mais ou vão dizer que nunca gostaram? Tsc...



Soube que em agosto deste ano, parece, na Chigado Comic Con, um fã foi até a mesa onde estava Rob e exigiu que este se desculpasse pelo que fez nos anos 90 e, não satisfeito, comprou um exemplar de How to Draw Comics the Marvel Way (um guia para desenhistas por Stan Lee e John Buscema) e deu de presente para Rob. Virou sensação na internet, uns a favor de seu gesto "heroico", outros contra.


Para finalizar este post, deixo vocês com uma das últimas que fiquei sabendo nosso Liefeld: uma história (The Godyssey, acho) em que os deuses gregos ficam meio putos por verem um humano sendo considerado Deus e vão tirar satisfação. Chegando lá, encontram Jesus (ele mesmo) pregado numa cruz e desafiam-no para porrada. O que Jesus faz? Desprega-se da cruz e cai pra dentro! Sério, história de Liefeld, Jesus cai na porrada contra os deuses gregos, até que Zeus himself desafia ele pra um mano-a-mano. E os dois partem pra descer o cacete um pra cima do outro... leiam um pouco aqui, em The Passion of The Liefeld. Formem suas próprias opiniões. Saudades dos grandes argumentistas/desenhistas do passado, como John Byrne, Walt Simonson, Frank Miller (no ínicio)...


Deixo-os agora com a conclusão do site original em inglês que inspirou este meu post: "Rob Liefeld ainda é contratado para trabalhar nas grandes editoras de quadrinhos. Ele é um dos artistas de HQ de maior sucesso, reconhecimento e popularidade na história, apesar de ser difícil de trabalhar, ególatra, teimoso e de perder prazos constantemente. Ele tem mais dinheiro do que muitos de nós vão ver na vida. Ele ainda não sabe desenhar um pé".





Música NÃO sugerida: O Passo do Elefantinho (Trio Esperança)



Leituras NÃO sugeridas: qualquer coisa que Rob Liefeld tenha feito como escritor, desenhista ou o que seja, ou que simplesmente tenha seu nome na capa.

sábado, 31 de outubro de 2009

Post Scriptum

(este post é meio que continuação do anterior)

* Foi muito bom o mea-culpa quanto ao Groxo/Sapo, atitude nobre, mas não te perdoo por uma coisa, Jotapê: Rorschach!
Permitam-me um adendo ou uma pequena digressão em relação ao post anterior, mas que versa sobre o mesmo assunto. Tive a felicidade de ler Watchmen primeiramente em inglês (ok, confesso que o capítulo 11 é foda de se ler mesmo em língua materna, que dirá acompanhar os pensamentos do "homem mais inteligente do mundo" em uma segunda língua). Digo felicidade mais especificamente por causa de um personagem: Rorschach (o preferido de 8 entre 10 que leram a HQ ou viram o filme). À medida em que a história passava, eu reparava que o bicho falava de uma forma meio esquisita, mas não sabia o porquê, só tinha a sensação de estranhamento mesmo. Até que um dia vi uma daquelas listinhas na net "você só percebe que anda lendo muito Watchmen quando...", e tinha um item lá mais ou menos assim: "fala sempre cortando os artigos das frases", ou algo do tipo. Aí eu reparei o que sua fala tinha de esquisito! Tem mesmo! E, se você reparar bem, se você realmente leu a história, e não apenas folheou a revista (falo mais sobre isso em um post futuro), vai perceber que isso caracteriza sim o personagem. Há uma explicação para ele falar do jeito que fala. Na verdade, há um único momento na história em que Rorschach fala como um humano comum. É só mais uma das dicas que Alan Moore plantou para o leitor se situar no tempo ao longo dos vários flashbacks da história. Na verdade, a fala de Rorschach reflete sua própria natureza interna, meio fragmentada, seu estilo de vida, sempre incompleto. E ela causa arrepios inclusive na Espectral, como ela mesma diz (depois ouçam um trecho do diário de Rorschach lido por ninguém menos que seu criador, o mago Moore em pessoa, mostrando como ele imaginava o modo de falar do bicho, e aí vocês vão perceber o quão inumana, robótica e monotônica deveria ser sua fala, e vão reparar que a voz aplicada por Jackie Earle Haley no filme é só uma imitaçãozinha do estilo Batman/Christian Bale de impostar a voz). Ok, vamos ao que interessa.

Fui ler a versão nacional, da Via Lettera, se não me engano traduzida pelo mesmo Jotapê. Percebam aí o original. Não há o artigo "THE" em duas frases. Na edição nacional, escreveram "O distintivo pertence ao Comediante. O sangue também." Viram lá os dois artigos acrescentados desnecessariamente? Isso é só um exemplo, mínimo. Há outros mais conspícuos ainda. Cara, se tu for ler toda a história em português, quase não vai reparar em esquisitice alguma na fala do Rorschach! O tradutor simplesmente ou não percebeu que ele falava estranhamente, ou simplesmente decidiu ignorar isso e corrigiu suas falas para um modo normalzinho de falar. Pode parecer preciosismo de minha parte (sou só eu?), mas, para mim, isso descaracteriza o personagem! Se sua fala é seu modo característico de se expressar, e se distingue da dos demais heróis da trama, eliminar essa diferença elimina uma característica própria do personagem! E uma característica inclusive explicada na história, que faz parte do seu passado e do entendimento de quem ele é hoje. A gente consegue entender suas motivações e entender o enredo independente disso? Sim, óbvio, mas também perde parte da experiência total de se ler Watchmen, perde uma das arestas a ser apreciada da obra de arte. Alguém discorda? Marcou toca a tradução... (alguém sabe me dizer se a versão mais recente, da Panini, também é assim?)

Minha dica: se quiser ler mesmo e aproveitar todo o recurso narrativo de Watchmen, leia em inglês. Se só quiser folhear a historinha pra se divertir e achar legalzinho, leia a versão traduzida e divirta-se sem compromisso.

Não vou falar mais de traduções e versões, do que se perde quando se traduz, esse tipo de coisa, porque sei que é difícil mesmo o trabalho do tradutor, tentando ser fiel ao original e tentando manter o jogo de palavras que às vezes os autores utilizam.









Por exemplo, na parte em que os dois detetives recebem a ligação indicando a localização do Rorschach, vejam aí:




Ele pensa ter ouvido "raw shark" (tubarão cru), em vez de "Rorschach". Nos Contos do Cargueiro Negro, o gibi que o menino na banca lê nesta mesma edição, o náufrago mata um tubarão e passa a se alimentar dele, tubarão cru, para sobreviver. Essa história dentro da história não está lá à tôa. Os Contos do Cargueiro Negro contém analogias e pistas para a própria trama de Watchmen. E uma dica é dada exatamente nesse instante: o tubarão cru seria Rorschach, mas, como eu disse, falo mais sobre isso em um post futuro.

Então, como estava dizendo, sei de dificuldades como esta. Porém, um pouco mais de cuidado e atenção seria bom. Gosto de citar o carinho com que o dedicado pessoal do Vertigem (valeu, Bob Vertigo!) tem tratado as obras de Morrison, autor que adora jogos de palavras, Invisíveis e Patrulha do Destino (confesso que ficou interessante a adaptação oficial Abocalipse para Apocalipstick, um dos arcos de Invisíveis já traduzidos aqui no Brasil). Viu, trabalho bom é reconhecido por fãs!



(Agradecimentos especiais aos amigos Kleber e Guilherme pela ajuda e paciência com o Reino do Amanhã.)

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Isso é um trabalho para o Super...?

Um dia desses, estávamos eu e minha esposa na casa de um casal amigo nosso jogando um desses joguinhos de conhecimento geral e cultura inútil bem legais, quando caiu uma pergunta ou dica mais ou menos assim: também sou chamado de Mianmá. Eu prontamente respondi: "Birmânia". Eu errei. Bom, segundo a fichinha do jogo. Lá dizia que a resposta era Burma. Já há algum tempo, vi uma notícia sobre atentados ocorrendo em Mumbai. Pensei comigo mesmo "Mumbai, olha só, acabei de conhecer mais uma cidade indiana pra entrar para o meu acervo de cidades indianas de que eu já ouvi falar, composta por Nova Délhi, Calcutá e Bombaim"... No ano passado, todos sabem, houve Olimpíadas. Mas ela foi onde mesmo? Ah, é, foi em Beijing... mas não era em Pequim?
Peraí. Burma é uma forma inglesa algumas vezes utilizada para se referir ao país que, em português, recebe o nome de Mianmá (e suas variações com y no meio e r no final) ou Birmânia. Mumbai é outro nome que se dá para a cidade que, em português transliterado do inglês, é chamada de Bombaim. E Beijing é a forma como a China quer que o mundo conheça sua já tão conhecida e manjada Pequim.
Aonde eu quero chegar com essa zona toda? Eu quero chegar no Super-Homem. Ou seria no Superman?

Colecionei HQs entre meados da década de 80 até meados da década de 90, quando parei de ler e só voltei em 2000 e alguma coisa. Nesse hiato, algo engraçado aconteceu. Eu parei de ler Super-Homem, mas quando voltei, voltei a ler Superman (reparem como ele é chamado, por exemplo, nas versões de Reino do Amanhã da Abril e da Panini). Nunca gostei muito do personagem, sempre disse que as melhores histórias do Super-Homem não são histórias do Super-Homem (explico isso melhor em outros posts futuros), mas reconheço a importância do que ele representa. Mas o lance aqui não é sobre o personagem, e sim sobre o seu nome.

Aliás, tradução de nomes aqui no Brasil sempre foi algo, no mínimo, curioso. Vejam a matéria do Eudes, do Rapadura Açucarada, sobre isso aqui (Peter Parker pra Pedro Prado, fala sério...).

Ele cita casos como do Ricardito (Speedy, no original), e do Joel Ciclone (Flash I). Cara, Joel Ciclone, não sei por que, mas pra mim ficou legal. Deu um ar mais antiquado ao personagem, bem característico dele, que é da Era de Ouro. Mas Ricardito? De onde veio isso? Outro também que eu sou louco pra parar na frente do cara que deu seu nome e perguntar: Ajax. Eu sei da explicação do porquê não se utilizar Caçador de Marte toda vez, por causa do espaço dos balões de diálogo na história, já que na tradução do inglês para o português o texto geralmente fica maior, nossa língua usa mais espaço. Mas sair de Martian Manhunter para Ajax, tipo, do nada?!? O que que tem a ver???

Li uma vez um artigo do Jotapê Martins falando sobre o primeiro filme dos X-Men, e falando de um dos vilões do filme, o Groxo. Nesse artigo o Jotapê faz seu mea-culpa (literalmente), explicando que, depois do filme, o Sapo (seu nome é Toad no original) "não poderá mais ser chamado de Groxo como ocorre nas revistas". Boa, Jotapê. Reconheceu o erro, pediu desculpas, gostei*. Tudo bem que, da primeira vez que vi o Groxo, com aquela roupinha ridícula de bobo-da-corte-assistente-de-cientista-maluco-da-idade-média, achei que o nome... cabia bem na figura feia e saltitante. Mas você não tinha como prever que ele no futuro teria uma mutação secundária que o faria ficar mais anuro ainda como pedia seu nome original. É, tô falando da bendita língua que aparece, e é bem utilizada, por sinal, no filme (e não aquela mostrada por Phil Jimenez no arco Planeta X dos Novos X-men, da espessura de um punho, permanentemente para fora e inútil; como é que ele conseguia falar, e muito, com isso saindo da boca?). Tudo bem.

Outro caso, tão esquisito quanto o do Ajax, é o do... Magnum! Tudo bem, concordo que traduzir Wonder Man ia ficar no mínimo ridículo, e ia acabar com toda a seriedade e masculinidade do cara. Quem ia levar a sério um fortão no grupo chamado de Homem-Maravilha? Putz... Tiveram a boa ideia de não traduzir o nome literalmente, daí resolveram rebatizá-lo. Mas, hum, vamos ver, o que poderia ser mais másculo que maravilha e melhor pra refletir os poderes dele, hein? Já sei! Magnum! Hã? WTF?!? Seria por causa dos óculos escuros, lembrando o galã que, talvez, na época, fazia tanto sucesso (pelo menos para o tradutor) com o ator Tom Selleck (quem se lembra desse seriado, hein)? Po, deixava o cara com o primeiro nome que deram pra ele, quando ainda era vilão, apesar de ser um nome bem clichê de supervilão: Poderoso, ou Homem-Poderoso, sei lá. Mas, Magnum? Não...

E o Super, como fica? Por que deixou de ser homem e virou man? Reflexo do imperialismo cultural norte-americano? Talvez. Tendência da maior anglicanização do português num processo natural de desenvolvimento da língua? Duvido. Imposição econômica do mercado? Provável. Sei que fizeram isso com Guerra nas Estrelas. Quem chama a primeira trilogia de Guerra nas Estrelas é da época dela, ou até da geração anos 80 (meu caso). A segunda trilogia hoje só é chamada de Star Wars (ainda mais pelos fanboys dos anos 90 em diante), e foi devido a imposição da marca mesmo. Decidiu-se que os subtítulos dos filmes poderiam ser traduzidos (Ameaça Fantasma, Guerra dos Clones, etc.), mas o título principal deles, em qualquer lugar do mundo, deveria ser, sem exceção, Star Wars. Ao que parece, algo semelhante ocorreu com o escoteirão de Krypton. As importadoras de produtos como bonecos, lancheiras, camisas e outros produtos com a marca do famoso S não quiseram mais gastar com adaptações e novas embalagens, e quiseram unificar o nome usado no mundo todo visto que a fabricação desses itens se dá geralmente num único país e exportado aos demais. Por isso essa pressão cada vez maior em se utilizar Superman ao invés do já tradicional e bem aceito Super-Homem em português.

Fui, certa vez, na casa de uns primos, e seus filhos estavam assistindo um DVD do desenho da Liga da Justiça. Peguei a capa do DVD e perguntei para os moleques se eles sabiam quem era cada um ali mostrado na capa. Chegando na figura verde do marciano, falei que era o Ajax, ao passo que eles fizeram cara de estranhamento e disseram "não, é o Jon-Jonz!" Fiquei com cara de tacho, parecendo que tava mentindo pra eles, mas a mãe deles pegou a capa do DVD e na sinopse dele estava escrito algo como "Batman, Flash, Mulher-Maravilha... e Ajax: sete dos mais poderosos heróis..." Confiram a descrição do DVD à venda no Submarino. Repararam no nome do Ajax, apesar de no desenho em nenhum momento ele ser chamado assim? Outra coisa, repararam que na sinopse Kal-El foi chamado de Super-HOMEM?

Vou apresentar algumas contradições encontradas entre o nome dado ao personagem e o texto de algumas de suas histórias, advindas da nova nomenclatura que pretendem dar ao personagem. Primeiramente em três revistas em que o personagem é chamado exaustivamente de Superman, mas aí chega uma hora do texto em que não dava mais pra manter isso, senão seria perdido o jogo de palavras.

- Em Superman Paz na Terra, na antepenúltima página (4ª de trás pra frente): "Vejo agora que assumir essa responsabilidade foi ambicioso demais para um homem, mesmo sendo um Super-Homem.” Ué, até há pouco ele era Superman, na verdade ao longo de muitas páginas, mas nesta única frase ele voltou a ser Super-Homem rapidinho!

- Outra, em Cavaleiro das Trevas II, a Mulher-Maravilha pergunta: “Onde está o herói que me lançou ao chão e me tomou como um prêmio merecido? Onde está o deus cuja paixão destroçou o topo de uma montanha? Onde está esse homem? Onde está esse Super-Homem?” É, né, Diana, na hora do vamuvê ele deixa de ser Superman e vira um Super-Homem, né, safadinha?

- No arco de histórias de Lex Luthor Homem de Aço (muito bom por sinal, como eu disse as melhores histórias do Super-Homem não são histórias do Super-Homem), capítulo 5, últimas páginas, Lex fala: “Você não pode (ver minha alma). Pois, se a enxergasse, veria um homem que optou por negar a felicidade a si mesmo (...) pelo mundo. Um mundo sem um 'super-homem'.” Poxa, ficou legal, não? Dá mais sentido às palavras de Luthor quando se representa o adjetivo do nome de Kal-El, um qualificante de seu poderio e de sua posição no mundo.

- Agora, o lado contrário, quando decidiram que não ficaria legal martelar a cabeça do leitor com o nome Superman em toda a revista e só numa única frase desdizer tudo de antes e jogar sua versão traduzida. Pegue seu exemplar de Maiores Histórias Superman DC 70 anos, vá até a página 90 e leia: “Pelos próximos 72 anos, homem e supermen colonizaram os céus.” Horrível, não? E separei só uns poucos casos, com certeza há mais parecido com isso por aí (não acompanho a revista do Azulão mensalmente para mostrar mais).

Retomando Pequim. Há estudiosos que defendem o uso da palavra Pequim para se referir à cidade, visto seu uso já consagrado no português, inclusive com palavras derivadas, como a raça pequinês, por exemplo. Não vamos mudar o nome da raça para beijingnês, obviamente. O mesmo caso eu digo do Super: percebam que, todas as vezes em que órgãos de mídia se referem ao último filho de Krypton, chamam-no de Super-Homem. Perguntem para seus familiares, sejam pais, avós, ou mesmo primos de mesma idade, mas que não conheçam bem ou não leiam HQ: eles vão falar Super-Homem. Até mesmo referências dentro da cultura pop, inclusive seriados com bastantes afinidades com quadrinhos, como Heroes ou The Big Bang Theory, citam o herói como Super-Homem, e não Superman. O conceito de Nietzche, já consagrado em nosso idioma pátrio, é o do super-homem, não o do superman. Cara, passamos mais de 5 décadas chamando o cara de Homem, e agora sem mais nem menos vamos chamá-lo de Man? São pelo menos 50 anos ouvindo seu nome em português para abandoná-lo assim!

Conclamo todos nós a usarmos simplesmente aquilo a que nos fomos acostumados a ouvir a vida inteira. Não é mais simples usar aquilo que sempre usamos? Para que nos rendermos a uma imposição artificial e engolirmos o termo americanizado, se já temos nosso termo próprio? Entendo que as línguas evoluem, adaptam-se, mudam com o tempo e aceitam incursões de outros idiomas; adição de estrangeirismo é perfeitamente normal. Mas somente quando não temos um termo específico em nosso idioma para aceitá-lo. Usar uma forma estrangeira forçada goela abaixo em detrimento de um termo já tão bem traduzido e arraigado culturalmente em nosso idioma há décadas... isso para mim sim é antinatural!

Ou vamos agora mudar tudo? Afinal de contas, ainda falamos Homem-Aranha, e não Spiderman. Até quando? Falamos Homem de Ferro, e não Iron Man. Por quanto tempo? Vamos ver o futuro filme dos Vingadores, ou o filme dos Avengers? Quarteto Fantástico ou Fantastic Four? Mulher-Maravilha ou Wonder Woman? Podemos continuar assim ad aeternum...

Vocês podem até falar "poxa, mas são ordens editoriais e tal...", mas vamos lembrar comigo o caso do Shazam. Quer dizer, do Capitão Marvel. Viu, muita gente confunde o nome do cara, achando que é Shazam. Isso deveu-se a problemas de direitos autorais; quando a DC adquiriu os direitos do personagem, a Marvel já era detentora da marca Capitão Marvel. Logo, a DC teve de publicar seu herói usando na capa de suas revistas o título Shazam. Fica aí minha sugestão. Panini (ou qualquer outra que possa publicá-lo por aqui), que tal mostrar o título da revista como Superman, mas à parte isso, dentro dela, em todo o seu conteúdo, chamar o personagem da nossa forma tão conhecida, Super-Homem mesmo? Deixa os personagens dentro da história, ou o texto lá dentro, usando homem, só na capa se manteria o man. Não atrapalharia a questão da marca, e manteria a nossa tradição linguística na versão aportuguesada, além de evitar problemas como os expostos nos exemplos que dei lá em cima. Isso seria muito trabalhoso, seria tão difícil?


Seria um trabalho para o Super... Homem?




Vídeo sugerido: Eu tinha que ser um Super-Homem?




terça-feira, 20 de outubro de 2009

REFERÊNCIA OU CÓPIA?

Eu sei que existem personagens que são feitos em homenagem a outros. É o caso do Samaritano, de Astrocity. Ele é claramente uma alusão ao Super-homem. Da mesma forma que os inimigos do Planetary são uma clara referência ao Quarteto Fantástico. Agora... existem casos de personagens muito parecidos, e não sei se são declaradamente referências aos personagens de outras editoras ou se poderiam ser considerados cópias mesmo. Veja os exemplos abaixo, comparando personagens das duas grandes: Marvel Comics e DC comics.

Arqueiro Verde X Gavião Arqueiro

A diferença básica entre os dois personagens é que o Arqueiro Verde é milionário. Compare o resto... Ambos são exímios arqueiros que disparam flechas especiais. Até aí, normal, existem vários personagens que o são, inclusive fora dos quadrinhos. Só que os dois são também bastante ágeis, lutam bem e fazem ou um dia fizeram parte de uma equipe de megapoderosos: o Gavião Arqueiro dos Vingadores e o Arqueiro Verde da Liga da Justiça. Até o temperamento dos dois às vezes é parecido.


Flash X Mercúrio

Existe alguma dúvida? Ambos são os velocistas mais conhecidos de cada uma das editoras. Hoje em dia (ou pelo menos até quando li) o Flash passou a ter uma série de outros poderes por causa da supervelocidade, como atravessar paredes e destruir um objeto (às vezes até uma construção) fazendo-a vibrar. Só que o Flash mudou com o tempo. Da mesma forma que o Super-homem em suas primeiras histórias não voava, apenas saltava alto, o Flash do passado também era mais limitado. Aliás, o Mercúrio parece ser exatamente esse Flash mais limitado. É apenas superveloz, sem poderes extras por conta disso, e nem é tão rápido quanto o Flash atual. Até o uniforme do Mercúrio, se você observar bem, também leva relâmpagos nos detalhes, símbolo do Flash.

Super-homem X Gladiador

Esse é uma referência mesmo, como existem tantas outras ao homem de aço. O Gladiador, para quem não conhece, faz parte da guarda imperial do império Shiar, que de vez em quando aparece nas histórias dos X-men. Em outras palavras, é um supercoadjuvante meeeeeessmo! Seus poderes: Voo, megaforça, megarresistência (até aí, é só um modelo básico), dispara raio de calor dos olhos e pode dar um supersopro. Opa! Super-homem total, não é? A diferença: o poder do Gladiador depende de sua confiança, enquanto o do Super depende do Sol. Mas, como disse, ele não é cópia, é uma referência mesmo. Reparem na capa da revista, onde está escrito “Homem e super-homem", em que a equipe enfrenta o Gladiador. E na capa da revista do Super-homem onde está escrito: "Super-homem enfrenta uma legião de super-heróis". Ambas foram feitas por John Byrne. Assim ele evidencia que o Gladiador é uma referência ao Super-homem. Seria a legião uma referência ao Quarteto Fantástico também? Um gênio como líder, um brutamontes, um que tem poderes ligados ao fogo e uma garota que fica invisível? Parece...

Caçador de marte X Visão

Das comparações que fiz, esses são os menos parecidos. Já é um exemplo de como dois personagens podem ser parecidos conceitualmente. Repare: ambos são, ao seu modo, alienígenas. O Caçador porque é de Marte, o Visão porque é um robô (Opa! Desculpe, um sintozoide). Ambos têm uma maneira fria de pensar e agir (estou falando do Visão de personalidade robótica mesmo, e não do Visão cheio de sentimentos que se casou com a Feiticeira Escarlate). Ambos são considerados sombrios e às vezes provocam calafrios nos próprios membros de suas equipes. Na aparência, os dois voam com leveza, usam longas capas e são “carecas” de olhos fundos e frios (compare as gravuras e diga se não são parecidos). O Visão, além de voar, tem certo controle sobre seu corpo, que o permite ficar intangível ou muito rígido. O Caçador de Marte também voa, também pode ficar intangível, é invulnerável e controla seu corpo, podendo moldá-lo. O Visão dispara raio dos olhos e o Caçador de Marte lê mentes, é nesse ponto que se diferenciam. Eu acredito que o Visão pode ter sido inspirado na figura do Caçador de Marte, o que não caracteriza uma cópia, pois eles são semelhantes, mas ao mesmo tempo possuem diferenças fundamentais. Digamos que seja um estilo de personagem... Particularmente, gosto dos dois.

Namor X Aquaman

Os dois reis do mar. Quer dizer, o Namor é o príncipe submarino, enquanto o Aquaman é um rei. Rei dos Atlantes, uma raça que na DC vive debaixo d’água, assim como os... Atlantes, uma raça que na Marvel vive debaixo d’água. Nada sutil, né? Ambos podem respirar tanto na água quanto na superfície. Ambos possuem força e resistência sobre-humanas. É verdade que o Aquaman pode convocar mentalmente animais aquáticos e o Namor, voar por causa de asas nos tornozelos (não sei o que é pior: o fato de que asas tão pequenas obviamente não o permitiriam voar ou imaginá-lo com grandes asas nos tornozelos), mas o Aquaman é claramente uma resposta à criação do Namor nos domínios dos mares das editoras. Existe alguma dúvida? Aliás, para quem veio até esse blog em busca da resposta para o probleminha de lógica, o Namor é a resposta. Dos cinco casos citados, os quatro primeiros personagens da Marvel foram criados depois dos da DC, o Namor é o único que a Marvel criou antes. Portanto, se houve cópia ou referência, os personagens da Marvel que foram inspirados nos da DC, com exceção dos mestres do oceano.
Existe ainda o caso do Monstro do Pântano da DC e o Homem-Coisa, da Marvel. Também há grande semelhança. Porém, isso envolveria falar de um outro personagem, ainda mais antigo... Deixo para vocês então um link para outro blog, que fala mais aprofundadamente sobre o assunto: http://www.uarevaa.com/2009/10/o-monstro-do-pantano-criatura.html

terça-feira, 6 de outubro de 2009

SOM e FÚRIA*

Esse é o cara. Raio Negro. Ou melhor, Blackagar Boltagon (Black Bolt, sacaram?). Ainda bem que pelo menos o nome original do cara não traduziram, deve ser meio ridículo alguém chamado Raioagar Negroagon – ou seria Raioagon Negroagar? Bom, deixando isso de lado, vou falar sobre o rei dos Inumanos, um dos módafoca mais overpower da Marvel, na minha humilde opinião. Mas vou tentar explicar a vocês meus motivos. Vamos começar com uma leve introdução.

Raio Negro foi criado por Stan Lee e Jack Kirby, e apareceu pela primeira vez numa história do Quarteto Fantástico, mas logo depois contracenou com um monte de outros personagens. Ele é soberano da espécie dos Inumanos, uma ramificação da raça humana, manipulada geneticamente pelos alienígenas Krees num passado distante, que evoluiu distintamente. Uma sociedade rigidamente dividida em castas, monárquica e escravocrata. Para uma melhor compreensão do funcionamento da sociedade dos Inumanos, recomendo a minissérie, ganhadora do Prêmio Eisner, de Paul Jenkins e Jae Lee (ambos também de Sentinela, outra boa obra). Todo inumano, quando alcança determinada idade, atravessa um rito de passagem chamado Terrigênese e se expõe às Névoas Terrígenas, que lhe possibilita aflorar suas capacidades genéticas, garantindo-lhe poderes e às vezes alterando drasticamente sua aparência. A base da sociedade inumana é, portanto, a diferença, paradoxalmente ligada à rigidez de sua estratificação social. Tal ritual também expõe deformidades e eleva quaisquer defeitos genéticos existentes. Devido a isso, a sociedade inumana desenvolveu um sistema de eugenia, melhoramentos genéticos e casamentos consanguíneos para minimizar tais defeitos. Raio Negro foi concebido para ser o ápice da evolução inumana, e exposto às Névoas Terrígenas ainda embrião. E é o mais poderoso inumano que já existiu. Além de sua capacidade de controlar elétrons e assim manipular matéria e energia, seu maior poder é sua voz. Um mero sussurro é capaz de fazer uma sala inteira em pedaços, e um pequeno grito talvez seja mais potente que uma bomba nuclear. Quando chorou pela primeira vez, ainda bebê, quase destruiu a cidade, como visto aqui.

Devido à grandiosidade de seu poder, que era um perigo para toda a sociedade, Raio Negro teve de passar 19 anos isolado e recluso numa câmara especial à prova de som para conter seus poderes, onde desenvolveu técnicas capazes de controlá-los, até ser possível viver em sociedade sem riscos. Viver uma vida em eterno silêncio.

Raio Negro casou-se com Medusa, e forma a Família Real Inumana, ao lado de Gorgon, Karnak, Triton, e Cristalys. Reparem no desabafo da rainha Medusa a uma de suas amas, ao falar sobre como é ser mulher do mais poderoso dos Inumanos.

MEDUSA: "Meu esposo... às vezes, ele me olha de um jeito que me faz sentir segura de seus sentimentos. Em outras ocasiões, ele é um enigma. Eu queria... de vez em quando, eu preciso tanto ouvir as palavras. Só que ele não pode dizer nada, jamais poderá."

AMA QUALQUER: "A Senhora receia que ele cometa um erro?"
MEDUSA: "Não. Nunca. Mas esse é o problema. É aterrador pensar que meu marido é capaz de selar a porta da sua mente... e trancar tudo e todos para fora.
Inclusive eu."


Sempre me amarrei em personagens conflitantes com o próprio poder, e sempre adorei o tipo de "lei da compensação" que a Marvel aplica em vários de seus personagens (Professor X tem a mente mais poderosa do planeta presa em um corpo inválido, Hulk é o avatar da força mas não tem nenhum controle, o poder da Vampira é sua eterna maldição, etc.). Lembro que, da primeira vez em que vi o Raio Negro, fiquei meio que maravilhado e meio que assustado, a figura do monarca inumano exigia respeito e admiração. A aura de nobreza e mistério que circundava o personagem tornava-o mais interessante (repare que nunca foi apresentado, jamais, um balão de pensamento revelando o que ele está pensando). Já tinha noção que o cara era poderoso, mas só depois que li Terra X (fiquem de olho, a Panini vai relançar, ou melhor, lançar, Terra X completa!!! Nada mais de histórias retalhadas) que comecei a perceber a verdadeira extensão do poder do bicho. Se vocês já leram e se lembram, mais pro final da história Raio Negro simplesmente encarou no mano a mano os Celestiais! Os Celestiais!!! No mano a mano!?!?! Po, os Celestiais são deuses, ou mais que isso, são deuses cósmicos!

"Uma voz que pode destroçar um deus... ou mais de um." Outra prova do quanto o Raio Negro é O Cara, essa bem mais sutil, mas não menos impressionante, abaixo.

Karnak, que tem a capacidade de detectar o ponto fraco de qualquer coisa ou pessoa, conversa com Gorgon:












KARNAK: "Estou preocupado com o rei."
GORGON: "Preocupado com ele? Pensei que isso fosse impossível. Você jamais pôs em dúvida as motivações de nosso rei. Sua lealdade ao Raio Negro é inquestionável. Qual é o problema?"
KARNAK: "Para interpretar o problema, você deve saber o que eu sei. Deve entender o meu... dom."




Sinistro, hein? Se nem aquele que tem o poder de encontrar a fraqueza de qualquer pessoa ou coisa consegue ver uma no Raio Negro... fala sério!

Se vocês ainda não estão convencidos de seu poderio, uma amostra do que aconteceu quando ele sussurrou a palavra "guerra" bem aqui e aqui. Até mesmo Apocalipse tem medo dele, vejam. Ou então sigam este link para ver alguns outros feitos mais de Raio Negro.

Sempre legado a segundo plano, como personagem coadjuvante, nos anos recentes, finalmente, vimos o personagem adquirir um pouco da grandiosidade que lhe era cabida, quando ele nos é apresentado como um dos membros fundadores dos Illuminati, a conspiração secreta de grandes líderes heroicos manipulando eventos por trás dos bastidores no universo Marvel (aliás, em uma das histórias desse misterioso grupo, Reed amplifica as energias vocais de Raio Negro para criar um buraco na própria realidade, mais uma prova de seu vasto poder sônico).

Pois bem, eis que vejo nas bancas Guerra Silenciosa. Uau, massa, o título já evoca guerra, e logo na capa vemos som e fúria do rei dos Inumanos. "Quando as Névoas Terrígenas são roubadas pelo governo norte-americano, os Inumanos declaram guerra aos EUA, uma guerra na qual uma única palavra pode devastar todo o planeta." Muito boa a história, principalmente a atitude do Sentinela (outro overpower, conhecido como o super-homem da Marvel só pela apelação, mandado pela SHIELD à frente de batalha para conter o poderio inimigo) com relação ao Raio Negro. Ambos são tratados como os arsenais atômicos das duas grandes potências durante a Guerra Fria. A presença do Sentinela garante que Raio Negro não faça nada, e vice-versa. Cada lado põe sua peça mais poderosa no jogo não para participar e vencer, apenas para impedir que o adversário use sua peça mais poderosa também. Há quem diga que Sentinela, com "o poder de mil sóis explodindo" (o que quer que isso signifique) amarelou... Outro "confronto" curioso na história é quando Jamie Madrox parte para cima de Raio Negro com um bastão, e Layla Miller tenta intimidá-lo dizendo que não dá para derrotar o Homem-Múltiplo, pois cada vez que acertam nele, surge uma cópia sua. Medusa responde o desafio: "Meu marido tem o dom de fazer cada elétron em seu corpo se colidir simultaneamente com o elétron adjacente. Faz ideia do que aconteceria?".

Porém, à parte isso, Guerra Silenciosa ainda trouxe algo de que definitivamente não gostei. Vimos ainda há pouco o quão incólume, frio, íntegro Raio Negro pode ser. Apesar de se manter firme em sua posição de declarar guerra aos EUA, ir contra seus amigos heróis e arriscar a própria segurança de seu povo, em determinado momento da história, o rei vê seu irmão beijar Medusa, e reage... assim:

Po, cadê a imagem do impassível, quase blasé, do rei todo-poderoso? Cadê toda a dignidade de Sua Alteza? Tudo bem que cada autor trata seus personagens da maneira que convier melhor à sua história, captando uma nuance específica que queira mostrar... mas descaracterizar a personalidade do personagem assim? Talvez ele quisesse mostrar um lado mais humano do personagem... mas po, o cara é Inumano! (tudo bem, o trocadilho foi fraco...)

Para piorar ainda mais a situação, li Hulk Contra o Mundo (World War Hulk), e adivinham quem é o primeiro dos Illuminati que o verdão resolve pegar na porrada quando volta de seu exílio? Exatamente, o "mais poderoso deles".

Vamos lembrar a última briga que o Hulk teve com Raio Negro, e o resultado da peleja:

01-02-03-04 (imagens retiradas do blog Black Zombie).

Raio Negro não só aguenta um murro direto do Hulk, como acerta um no gigante verde. Eles trocam uns sopapos até que o inumano abre sua boca e faz a cidade inteira tremer... derrubando finalmente o verdão.

E no Hulk Contra o Mundo?
Não dá pra saber ao certo o que diabos o Golias Esmeralda fez, mas a prévia da luta vocês acompanham desde aqui, aqui e aqui, até aqui.
Mas esperem. Deve ter algo errado aí. Pra tudo há uma explicação. Não é possível que esse Raio Negro todo quebrado aí do lado seja o mesmo Raio Negro que venho apresentando desde o início. Não mesmo.
E não é!

Ainda não li Invasão Secreta (gosto de esperar essas sagas chegaram ao fim para poder lê-las de uma vez só), mas já sabemos previamente que um dos Illuminati foi trocado por um Skrull, e que esse foi justamente o rei dos Inumanos. Resta saber agora: COMO diabos isso foi feito, e ONDE está o verdadeiro? Sei que logo após a Invasão Secreta haverá War of Kings, e parece que o Raio Negro, o original, o modafóca, o Cara, vai à desforra pancando todo mundo pelo universo! Vamos esperar para ver. Dizem que no espaço ninguém pode ouvir você gritar... a menos que você seja o monarca dos Inumanos!

*O título deste post vem de Macbeth, de Shakespeare, reproduzido em Admirável Mundo Novo, e não se refere à minissérie homônima da Globo (apesar de que esta eu também recomendo, fez com que eu acreditasse ainda haver qualidade na TV aberta).

- Minissérie sugerida: Som e Fúria, Globo.

- Música sugerida 1: Enjoy the Silence (Depeche Mode)

- Música sugerida 2: The Sound of Silence (Simon & Garfunkel, versão do filme Watchmen)


Rodrigo.