domingo, 24 de janeiro de 2010

LOCAL


Chegou às livrarias e às bancas há não muito tempo a revista LOCAL – fim da jornada, que fecha a história. São apenas dois encadernados, o primeiro é o ponto de partida.

Alternativo

A história não é de nenhuma das duas grandes (Marvel e DC), também não fala de super-heróis, aventuras nem nada do tipo, por isso é duplamente alternativa. Mais alternativo que isso só Persépolis, que além dessas duas características não é estadunidense (leia o post Da Pérsia, com carinho para mais informações). LOCAL fala da história de uma garota comum, que vive viajando pelos Estados Unidos em busca de um lugar para ficar.


A proposta

Uma das coisas bem legais nos encadernados é que, ao final de cada um dos capítulos (são doze, no total), há comentários do desenhista e roteirista. Bom, pelo menos é legal para quem escreve roteiros para história em quadrinhos – como eu – e para pessoas que se interessam pelo processo de criação. Lá pelo início o roteirista solta que a proposta de LOCAL é retratar as características culturais presentes nas cidades pela qual a personagem principal, Megan, passa. Isso porque cada capítulo é um ano da vida dela (ele também revela isso), vivido em um lugar diferente.


Infelizmente...

A proposta não é atingida. Nem todas as histórias mostram aspectos culturais das cidades por onde ela passa, embora todas elas estejam mergulhadas dentro do contexto cultural (duas coisas diferentes). Em alguns capítulos a personagem principal mal aparece, portanto não se sente mudança em sua vida. Com isso, o leitor fica solto:

parece um compêndio de histórias diversas, que às vezes só tem uma remota relação com a personagem principal.


Porém...

A história é muito boa! Mesmo assim. Boa porque foge à mesmice. Boa porque alguns capítulos enfatizam bem as características locais, e outros enfatizam bem a história da personagem principal. Boa, principalmente, porque as histórias dos capítulos, tendo relação ou não, são boas histórias.


Conclusão

No segundo encadernado, em especial, o leitor conhece um pouco melhor a personagem, entende por que ela fica mudando de lugar. O roteirista remete a coisas que aconteceram no passado em alguns capítulos, amarrando toda a história. E o último capítulo realmente fecha a história da Megan. Quer uma opinião? Vá até uma livraria, procure LOCAL – ponto de partida e leia a primeira história. Você vai gastar só alguns minutos, o capítulo é rápido. Se gostar, leve para casa.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Ideia de Um Milhão

Quem quer um milhão?
A DC quer. Era 1998, e alguém na editora teve a ideia de supor: “se a revista Action Comics, de 1938 (aquela em que aparece o Super-Homem pela primeira vez), seguisse sua continuidade mensal, quando será que ela chegaria ao número um milhão?” E eles chegaram ao ano 85.271. E resolveram fazer uma saga sobre isso. E esta saga de dez anos atrás já continha DICAS SOBRE O FINAL DE BLACKEST NIGHT. O quê? Isso mesmo. Voltemos a isso depois...
Grant Morrison, então levando o título da Liga da Justiça, foi o responsável por escrever a minissérie principal, que repercutiu por todas as publicações da DC. O que mais ressalta, primeiramente, nessa saga, foi o fato de que ela não se estendeu ao longo de vários e vários meses. Inovadoramente, ela foi feita toda em apenas um mês, abarcando cerca de 40 edições. Pois é, todas as edições da DC de novembro daquele ano estamparam a numeração 1.000.000 em suas capas, retomando sua sequência normal no mês seguinte.

O plot da história é fraquíssimo: no século 853 (!), a Legião da Justiça Alfa, formada por descendentes da atual Liga (!!), resolve convocar a Liga da Justiça de hoje para participar de uns joguinhos olímpicos meta-humanos no futuro (!!!) para homenagearem o primeiro Super-Homem, que está vivo (!!!!) naquela época e vai retornar de seu exílio no Sol (!!!!!). Apesar desse mote ridículo, a execução da ideia é bem rápida, dinâmica, e quero neste post resgatar alguns bons conceitos apresentados em DC Um Milhão. E falar como ela já predizia o futuro de Blackest Night.

Muito boa, por exemplo, a descrença inicial de Caçadora, Oráculo e de Zauriel, que perguntam qual seria a probabilidade de haver vida humana, que dirá descendentes deles, daqui a tanto tempo. E, é claro, a atitude de Batman frente a essa historinha mal contada de jogos e desafios no futuro: “O presente é que me preocupa” (vide a mesma atitude na obra Terra 2, também do Morrison):Mas o Batman Um Milhão decide que ele deve ir, mesmo à força, e derrota o atual usando uma técnica de luta física e psíquica, mandando sua essência ao futuro. Diana não nega sua ascendência grega e fica toda excitadinha com a perspectiva de olimpíadas de superseres... Outra ideia bem bacana é o simbolismo dos heróis da Legião da Justiça, cada um radicado num planeta do sistema solar, espelhando a visão morrisoniana do panteão da DC: Flash, o mais rápido, é o guardião de Mercúrio; Mulher-Maravilha é de Vênus; Netuno, é claro, fica com Aquaman; Batman monitora Plutão, o planeta-prisão do sistema (punidor como o Hades); Saturno (Cronos) fica com o Homem-Hora, que já havia aparecido anteriormente numa história da Liga de Morrison; Júpiter, com sua grandiosidade, é sede da LJA Um Milhão; Starman opera em Urano (o Céu); e mais tarde descobrimos que Marte ainda é vigiado por Ajax, claro.
A Legião da Justiça Alfa diz que ficará na nossa época para manter o mundo a salvo, e assim fica a deixa pra história se espalhar para outros títulos, a fim de os leitores conhecerem os poderes (apelativos) dos heróis do século 853. Super Um Milhão, por exemplo, além de dez novos supersentidos (adquiridos pela Dinastia Super quando o Super-Homem do séc. 67 casou-se com uma ser da 5ª Dimensão), da super-hipnose e da supertelecinese, capaz de soprar uma lua de órbita e de calcular bilhões de probabilidades simultaneamente, é descrito como “mais rápido que um táquion, mais poderoso que a gravidade de um buraco negro, capaz de transpor anos-luz com um salto”. Mas, sem o supersol de sua era para abastecer seus poderes, começa a perdê-los um a um no presente... (boa jogada dos argumentistas para trabalharem um carinha tão fuderoso).

É claro que a coisa toda ia dar merda. Assim que são mandados para o futuro, descobrimos que Solaris, o computador solar, na verdade havia mandado um vírus para infectar toda a humanidade no passado para enfim conseguir sua vingança contra a Dinastia Super-Homem e substituir o sol, mancomunado com o imortal Vandal Savage. Agora me digam: pra que diabos um supercomputador iria querer substituir o sol??? Uaréva...

Destaque especial deve ser dado, entre todas as edições, para a Starman 1.000.000, a melhor história individual da saga. O Starman do futuro conversa com Ted Knight, o Starman original, e conta como, durante uns três milênios, não houve nenhum Starman, e como alguns da linhagem até mesmo foram vilões. Ponto para James Robinson (escritor da ótima fase do Starman), e maior ainda quando diz que sua "cria", Jack Knight, NÃO é o maior Starman, e que na verdade foi até esquecido no futuro... coragem do autor, e humildade, visto que quem já leu concorda que acontece justamente o contrário com Jack Knight.

Os conceitos legais extraídos de DC Um Milhão: os ícones que dão superpoderes. Achei muito boa a ideia, bastante significativa, principalmente no universo DC, em que os próprios heróis são bastante emblemáticos e icônicos. É só ver o quanto os escudos de cada superser representam e são seguidos, com vários carregando o S estilizado, e outros com o morcego no peito. No ano 85.271, vestir um relâmpago amarelo com fundo vermelho lhe dá supervelocidade momentânea! A própria Legião dos Super-Heróis ("só" mil anos no futuro a partir daqui), já utilizava bastante esse conceito das imagens representando seus heróis e poderes. Todo o universo DC é focado nestes símbolos heroicos, como visto nessa imagem idealizada para Crise de Identidade:

Outro conceito legal: daqui a tanto tempo, a própria noção de espaço vai ser diferente. A humanidade descobriu como manipular espaços tesseracts, de quarta dimensão, para fazer megalópoles inteiras superpopulosas caberem em espaços exíguos conservando o meio ambiente.
E a própria noção de informação como riqueza na comunicação mais rápida que a luz. O planeta Mercúrio, colonizado no futuro, é uma infocracia, quem detém informação detém o poder, e a própria se desatualiza muito rapidamente, ainda mais num futuro em que sua troca é multiplicada por um milhão! Globalização nada, "Sistema-Solarização" é o futuro! E a Neuronet, sintonizada diretamente em seu cérebro, seria o canal de informações no séc. 853. Bem bacana.

Outra proposta muita boa é a que justifica a presença de Robin, o droide-prodígio parceiro do Batman Um Milhão. Ele guarda a essência de seu mestre de antes do massacre que matou sua família e milhares de inocentes. Robin seria então a inocência, a pureza de Batman, uma neurocópia otimista de sua infância preservada no droide para sempre lembrá-lo de equilibrar as trevas com a luz ainda não corrompida neste inferno que se tornou Plutão. Interessante essa visão de parceiros-mirins...

Curioso observar como Grant Morrison já plantou, há mais de dez anos, elementos que depois ele mesmo resgataria, agora que é um dos caras que mandam na DC. Por exemplo, o conceito da Dinastia Super-Homem, o sol tirânico Solaris e o próprio Super do séc. 853 reaparecem na sua obra Grandes Astros: Superman, assim como o Super-Homem primordial exilado dentro do Sol.

Até mesmo uma ideia não tão boa assim, como o "punching time", teve sua origem aqui. Se alguém se lembra (e não gostou) do Superboy Primordial alterando a realidade através de socos em Crise Infinita, saibam que o Super Um Milhão atravessou a barreira do tempo através de socos anos antes:


Num especial publicado um ano depois da saga, inédito no Brasil, chamado DC One Million 80-Page Giant, são apresentadas pequenas histórias ambientadas no ano 85.271, e assim descobrimos a origem do Eléktron Um Milhão (muito legal a história), sabemos um pouco mais sobre a Legion of Executive Familiars, liderada por Kryto-9, e uma boa história chamada Crisis One Million, em que a Legião da Justiça Alfa encontra sua contraparte do universo de Qward. Curioso observar o uniforme da híbrida Mulher-Coruja (ao lado, lembra quem?), e perceber como algo parecido com o gerador de azar gerando sorte no reversoverso de Qward seria novamente utilizado em Terra 2. Além do mais, percebam a presença de outras versões, como Batman de 1889, Batmirim, Super do Reino do Amanhã e de Red Son, entre outros, já antevendo a Crise Final e o Multiverso de Morrison (?), na história:

Falando em antever, a PREVISÃO PARA BLACKEST NIGHT: em Martian Manhunter 1.000.000, ficamos sabendo que Ajax ainda está vivo no séc. 853, e se tornou uno com o solo marciano. E aqui ele faz uma revelação a Kyle Rayner: "Foi você, afinal, quem me resgatou quando tudo estava enegrecido." E continua: "Há uma mensagem que quero que entregue ao meu eu de sua época"...Hmmmm, quando tudo estiver enegrecido... quer uma referência mais óbvia a Blackest Night? Já que sabemos que o marciano está do lado negro agora, nos States, resta esperar. Será que Kyle é quem vai salvá-los e trazê-los de volta? Vamos aguardar a resposta em alguns meses... mas não um milhão deles!

- Filme sugerido 1: Quem quer ser um milionário? (Slumdog Millionaire, 2008).

- Filme sugerido 2: Timecrimes (Los Cronocrímenes, 2007).