sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Zoo

Zoo era a história em quadrinhos mais cara da mesa de HQs brasilienses da Livraria Cultura. Relutei... Olhei a capa, me parecia interessante... Olhei o interior, bem acabado, bom material, desenhos limpos com cores vibrantes... Dei uma olhada na contra-capa, onde há um macaco carregando um bebê e a frase “Em um mundo onde os humanos são os animais, ainda há quem lute por eles”. Era a mais cara, mas a mais bem produzida e também me parecia a mais interessante. Decidi comprar.
Confesso: quando pego obras nacionais, e ainda mais, regionais, não gero uma expectativa muito grande, pois sei das dificuldades de se produzir e colocar no mercado um material bom. Entretanto, Zoo, da HQM Editora, superou minhas expectativas e me fez repensar essa postura. Eu sou chato. Eu sou muito chato! A ponto de ficar puto em perceber que uma editora acabou com o suspense de uma página ao colocar a revelação de página inteira na página da direita. Todo mundo olha primeiro a página da direita, passando reto pela página da esquerda, ainda mais esta sendo composta exclusivamente por imagens, sem diálogos. Esperava encontrar pequenos defeitos em Zoo. Não que procurasse, encontraria naturalmente, em virtude desse criticismo ao estilo House.
À medida que fui lendo, fui automaticamente analisando a obra. A questão narrativa é a minha especialidade, e percebi, de cara, uma coisa: o livro não é uma cópia de Planeta dos Macacos. Refiro-me a sequência de cinco filmes produzidas há algum tempo e à relativamente mais recente versão de Tim Burton. Macaco na capa, protegendo humanos, pensei: essa história eu já conheço. Tudo bem, a inspiração certamente veio de lá, mas penso o conceito de originalidade não como algo completamente novo (se é que isso existe!). Se você usa uma mesma ideia básica e a trabalha de maneira bem distinta, é original para mim. Zoo não é uma cópia, nem uma história muito parecida com Planeta dos Macacos. Foi minha primeira quebra de expectativa.
Continuei a leitura e percebi que o narrador – Nestablo Ramos – foi guardando surpresas, revelações ao longo da história. Zoo surpreende, e não é apenas no final. Mais um ponto para Nestablo. Em termos de ritmo de narração, condução do leitor, suspensão da descrença, reflexão, ação e suspense (eu disse que era chato), mais uma vez Nestablo é bem-sucedido, assim como na construção de personagens. E o tema abordado é universal, não se prende nem à Brasília, nem ao Brasil.


Só que minha análise, quando se trata de quadrinhos, não se restringe ao aspecto narrativo, embora ele seja o que mais considero até mesmo por ser eu mesmo um autor literário. Analiso alguns aspectos mais técnicos, como o exemplo que dei de revelação em página inteira, que sempre deve estar na página da esquerda da revista. Os desenhos são limpos, as cores são vibrantes, isso já tinha dado para ver naquele folhear indeciso antes de comprar. Só que o desenho é também muito expressivo, trabalhado eficazmente na condução da história. Os personagens animais expressam bem as personalidades, as imagens provocam o leitor, principalmente na transmissão da mensagem que Nestablo quer passar.


Entrando em alguns detalhes, as páginas são limpas, claras, não fazem a gente franzir as sobrancelhas e ficar tentando adivinhar o que está desenhado ali (como já vi acontecer em histórias até da grande Marvel). A distribuição dos quadrinhos dentro das páginas, os destaques nas cenas, a emoção que passam, até a posição dos balões em relação ao desenho e a maneira como os diálogos conduzem o leitor... tudo perfeito. Eu que esperava encontrar um monte de defeitos...
Qual foi minha surpresa ao descobrir, em conversa com o autor, que ele fez absolutamente tudo na obra: roteiro, desenho, cor e letra. Com toda essa qualidade? É, meu caro Nestablo, você é uma prova de que é possível fazer história em quadrinhos nacional de extrema qualidade. Deve haver outros autores por aí, espalhados por todo o Brasil, escondidos em suas cidades. Basta uma empresa disposta a investir nesses potenciais ou nesses profissionais (uma salva de palmas para a HQM Editora), porque talento a gente tem para produzir material com qualidade suficiente para vender aqui dentro e no exterior. Se alguém duvida, leia Zoo.



domingo, 10 de outubro de 2010

Irreverência ou Cópia?

Vocês já imaginaram um confronto entre o Sentinela da Marvel contra o Super-Homem da DC? Eu lhes digo que este embate já ocorreu! Conto mais ao fim deste... e de quebra ainda dou um cube papercraft único e exclusivo do Overman!
Como o Guilherme já bem disse em um post anterior (há um ano), há personagens que são bastante parecidos com outros. Há alguns casos que são por coincidência, há alguns que são verdadeiramente plagiados (conscientemente ou não), e há outros cujas semelhanças são propositada e intencionalmente forçadas. Bom, não sei em quais casos cada um que apresentarei abaixo se enquadra, mas busquei sortear um elenco que apresente casos curiosos e até versões engraçadas de outros personagens, inclusive em outras mídias que não quadrinhos (ou BD ou comics).


Capitães Marvel
Um jovem que adora usar jeans e roupinhas datadas que, após descobrir acidentalmente algo incomum numa caverna, ao emitir determinado comportamento (verbal ou gestual), é tomado por forças desconhecidas e troca de corpo com uma versão super-heroica adulta mais forte, mais resistente, capaz de voar e dotado de uma consciência ou sabedoria acima da de qualquer ser humano. E essa versão "aprimorada" responde pela alcunha de Capitão Marvel. Bom... qual dos dois? Os dois! Durante uma intriga sobre os direitos do Capitão Marvel entre a DC Comics e a Fawcett Comics (a primeira alegava ser o Capitão uma versão do Super-Homem), a Marvel conseguiu os direitos sobre o nome Capitão Marvel e publicou seu próprio personagem, obrigando a DC a lançar seu personagem, após adquiri-lo, sob o título de Shazam em suas capas (daí a famosa confusão de muitos acharem que Shazam é o nome do herói). E por conta disso também, a Marvel é obrigada a lançar a cada ano ou dois alguma publicação com o título Captain Marvel na capa para não perder seu direito sobre o nome (daí a quantidade de personagens diferentes na própria Marvel usando o mesmo pseudônimo). A única distinção entre a versão da DC e a da Marvel é que esta última trocou as características místicas/divinas por habilidades científicas/alienígenas.


Mads and Freaks

Personagem cômico, com nome que lembra algo louco ou esquisito, de pele azul, uniforme inteiriço monotônico, com uma exclamação no peito como emblema, e com uma espécie de raiozinho estilizado na testa ou cabelo, que ganhou reflexos extraordinários após um tipo de acidente. Segundo o criador de Madman, Mike Allred, ao criar Freakazoid, Bruce Timm o informou que Madman era uma das fontes inspiradoras de seu personagem. A controvérsia ocorreu quando Allred percebeu que, fora isso, nenhuma outra referência ou crédito foram feitos após a exibição do desenho animado, o que o chateou um pouco e o deixou um pouco desconfortável, apesar de reconhecer que seu próprio personagem, Madman, também é influenciado por muitas outras fontes. Mas a exclamação no peito ainda o perturba...


Harry Hunter ou Timothy Potter

Um garoto inglês mediano, franzino, de cabelos escuros e despenteados e óculos de armação plástica escura e redonda, órfão, que em seu aniversário de 12 anos descobre ter uma origem secreta que não conhecia e possuir um potencial (ou está destinado a) para ser o (ou um dos) mais poderoso(s) mago(s) quando crescer, ao ser abordado por indivíduos já experientes com magia, que ganha como presente destes uma coruja de estimação, e a partir daí tem acesso a um mundo cheio de criaturas fantásticas e misticismo. Óbvio que as semelhanças acabam por aí, mas como são muitas! Os rumos que Harry Potter toma em sua série de livros infanto-juvenis não se comparam com os que Tim Hunter toma em Livros da Magia, sob o selo adulto da Vertigo (apesar de que, em determinado momento da série, o autor Peter Gross brincou com as similitudes fazendo com que um irmão de criação de Tim, ao usar um artefato que o faz ficar parecido com Tim, tome um trem na plataforma 9 1/2 da estação King’s Cross, fazendo-o assim uma versão alternativa de Harry Potter). Digno de gentleman o comentário do Sr. Gaiman sobre o suposto plágio de sua obra, dizendo que ambos apenas beberam das mesmas fontes: "Não fui o primeiro autor a criar um jovem mago com potencial, nem Rowling foi a primeira a mandá-lo para a escola. Não são as ideias que importam e sim o que você faz com elas."



Sandmare

Ente místico ou abstrato, solitário, pálido, alto e magro, de cabelos negros desgrenhados que costuma trajar uma capa, reina na dimensão dos sonhos com capacidade de mandar pesadelos aos mortais, porém sendo dependente destes para existir, com poder ilimitado em seu reino, mas que às vezes se arrisca no mundo desperto. Será que só eu via semelhança entre os dois? Tudo bem que um é sombrio e do mal, e o outro... não, mais ou menos, sei lá. Pesadelo, vilão da Marvel, e Sandman, "herói" da DC. Curioso observar que as vestes de cada um refletem a época em que foram concebidos, sendo o uniforme do Pesadelo meio lisérgico, típico do pensamento dos anos 60, em contraste com o gótico cru e mais punk de Sandman, da década de 80. Mais engraçado que isso, porém, é o fato de a entidade maléfica usar roupa colorida verde e a entidade mais "boazinha" (se é que esses termos se aplicam) abusar do preto sóbrio...


Halloween Mask
Personagem mezzo sádico/mezzo cômico, sem inibições psicológicas ou sociais, insano, característico por sua face verde emoldurando um largo sorriso, vestido de terno, com poderes de mudança de forma limitada apenas por sua imaginação, reflexos aumentados, que frequentemente parece ignorar a gravidade, cuja origem está associada de alguma forma com o Deus Loki. Um é o famosíssimo Máskara (cuja origem relacionada a Loki só existe na versão cinematográfica), e o outro é o não tão conhecido Halloween Jack, da também não tão conhecida linha 2099 do Universo Marvel.




Nightspawn
Um negro que foi imbuído de poderes mas sabe que seu fim está próximo e que se vê obrigado a usá-los, usa uma máscara que cobre toda a face e uma longa capa vermelha quase viva, que lhe confere, assim como sua veste, uma variedade de capacidades, tais como planar no ar, curar feridas, aumentar seus reflexos. Olhem bem pro design do uniforme dos dois aí em cima. Nightwatch foi um personagem secundário (ou seria terciário ou quaternário?) que apareceu em algumas brevíssimas histórias do Homem-Aranha aqui no Brasil - pouco depois que Todd McFarlane deixou de desenhá-lo -, e que não fez muito sucesso. Ganhou seu uniforme tecnológico de uma versão futura de si mesmo que estava prestes a morrer. Spawn é a cria mais conhecida de Todd McFarlane - desenhista que alavancou durante um bom tempo a popularidade do Aranha enquanto o desenhava -, um dos carro-chefes da Image quando fora criada logo após a saída de McFarlane da Marvel. É um soldado do inferno que possui um traje simbiótico e que, quanto mais usa seus dons, mais se aproxima de ter sua alma destinada ao inferno.
Agora vejam o traje e a pose do Gatuno, inimigo do Aranha, desenhado por Todd McFarlane, pouco antes de criar o Spawn, enquanto ainda desenhava o Amigão da Vizinhança pela Marvel, ao lado... Sucessão de coincidências?



Os Patos

Um pato meio humanoide, falante, que usa roupas (mas não usa calças!), gravata, chapéu azul, bravo e de pavio curto. Donald é um dos mais conhecidos e queridos personagens de Walt Disney, e dispensa apresentações. Howard também é muito querido pelos fãs que o conhecem, um personagem que infelizmente foi severamente boicotado no Brasil. Apesar de já ter atuado ao lado do Homem-Aranha, do Dr. Estranho, do Homem-Coisa, da Mulher-Hulk, entre outros, e ter ganhado uma minissérie pelo selo adulto da Marvel, Marvel Max, nunca teve uma história sequer publicada no Brasil. Sua única aparição em uma edição nacional só ocorreu numa história isolada durante a Guerra Civil e em duas páginas da saga Invasão Secreta, juntamente com outras dezenas de personagens ao redor (e assim não poderiam tirá-lo da cena), sem nenhuma menção ou explicação qualquer. Suas histórias geralmente apresentam sátiras sociais, paródias com outras ficções, e é quase existencialista, além de bem humoradas. Como a Disney reivindicava muitas semelhanças entre os personagens, a Marvel decidiu então fazer com que o cínico pato Howard usasse calças, para diferenciá-los... Uma pena tal personagem nunca ter tido oportunidade aqui no Brasil.


Sentriumph
Herói loiro, poderosíssimo, capaz de derrotar o Super-Homem*, manipula o espectro eletromagnético, garantindo-lhe ampliada percepção sensorial, superforça, invulnerabilidade, voo, geração de rajadas de energia pelas mãos ou olhos, um dos maiores se não o maior herói de sua época, ajudou (em retcon) a fundar a maior equipe de super-heróis do planeta, esquecido por estes mesmos heróis e apagado da memória de todos como se nunca tivesse sido, e relegado ao esquecimento. Quando voltou a reencontrar seus antigos companheiros, estava mentalmente instável, ora tornando-se supervilão, ora se redimindo. Pois é, essa é a premissa do Sentinela, herói que causou um verdadeiro furor quando surgiu, devido a seu imenso poder e sua grande tragédia. Mas é também a mesma premissa de Triunfo, personagem pequeno que algumas - poucas - vezes atuou ao lado da Liga da Justiça. Sensação de déjà vu...
*Para quem gostaria de ver um combate entre Sentinela e o Super-Homem, ele já aconteceu sim! É só buscarem a Liga da Justiça de Grant Morrison, no arco Crise Interdimensional. Neste arco, com a participação especial do Capitão Marvel (Shazam) e de alguns gênios da 5ª dimensão, Triunfo enfrenta o Último Filho de Krypton.
Além de citar o caso, já mostrado lá em cima no início do post, do "super-herói" brasileiro Overman e de Space Ghost, ambos com identidades mais que secretas debaixo de uma máscara que nunca tiram, não poderia deixar de falar também dos Amigos da Justiça!
O patriótico Major Glory (pastiche tanto do Capitão América quanto do Super-Homem), the Infraggable Krunk (versão em negativo do Incrível Hulk), and Valhallen - palavra-valise ou portmanteau de Valhalla e Van Halen -, Deus Viking do Rock (alusão ao deus nórdico do trovão, Thor), formam um grupo desajustado de heróis do desenho animado apresentado pelo canal de TV a cabo Cartoon Network.


Os Ratos
Para finalizar, uma tirinha bem antiga de Fernando Gonsalez, com seu personagem-título, uma ratazana de esgoto, Níquel Náusea, encontrando seu parônimo(?) mais guti-guti, Mickey Mouse!
E aí, faltou alguma irreverência/referência que eu deixei de citar?


Filme sugerido: O Homem que Copiava (2003), de Jorge Furtado.
Comemoração ou tradição sugerida: festa de halloween.
Música sugerida: "Jump", de Van Halen.
Série de livros sugeridos: Harry Potter (a heptalogia).
Cubecraft sugerido: Overman (inédito, autoria própria).
HQ online sugerida: Tio Patinhas e Pato Donald em Dream of a Life Time (que talvez tenha inspirado o filme A Origem - Inception).
Posts sugeridos: Influências e Semelhanças do blog Alternative Prison.