terça-feira, 1 de junho de 2010

Tempestade Selvagem de Alan Moore

WildStorm, para quem não sabe, é a editora de Jim Lee (assim como a Top Cow é do Marc Silvestri), remanescente da Image Comics, e que atualmente se encontra de posse da DC. A Panini, espertinha como é, lançou um encadernado no Brasil para apresentar o que esta editora vem fazendo ultimamente, e escolheu um TPB só com histórias de Alan Moore para este selo. E não é que o mago barbudo consegue fazer jus à propaganda de seu nome? Vejam bem, não são histórias excelentes, as melhores já escritas pelo inglês, mas são legaizinhas, algumas até bem bacanas. Uma boa diversão. A arte é que, de modo geral, peca e não acompanha bem os roteiros.

A primeira história é com o personagem Majestic (sobre quem sei pouco, mas nada que a internet não resolva), apenas mais uma hipóstase do Super-Homem. Mas aqui Alan Moore nos apresentou o personagem nos últimos dias de vida... sua e do próprio universo! Como um dos últimos seres sencientes a restarem vivos enquanto a entropia toma conta de tudo o que existe, Majestic narra uma história em que ainda cabe o amor nesse fim dos tempos, e em que Moore demonstra um bom conhecimento de cosmologia (vide entropia e morte térmica do universo). Destaque especial para os últimos seres vivos a testemunharem o fim da vida, como por exemplo: uma estirpe inteligente de sífilis infectando um dos nove sobreviventes, um supercomputador criado para calcular os nove bilhões de nomes possíveis de Deus e perto do fim de seus cálculos, e um espírito abstrato da aritmética desgostoso pois todos os números possíveis estão se reduzindo a zero. Uma homenagem que Moore faz a contos de ficção científica, em especial a The Nine Billion Names of God, de Arthur C. Clarke, e principalmente a Last Question, de Isaac Asimov. Na verdade esta é a terceira versão deste conto que conheço, e todas são muito boas. O final é surpreendente (adoro twist endings, talvez seja um resquício saudosista meu de Além da Imaginação - Twilight Zone). Esta história é a preferida do Guilherme, parceiro e brother in arms deste blog
Outra história trata sobre Deathblow, ou algo assim. Apesar de ser uma história muito mais visual que narrada, tem-se a impressão de se passar muito rápido por ela. Talvez seja proposital para a proposta desejada por Moore, para deixar o leitor perdido como os personagens, não sei. Uma típica história de sobrevivência num ambiente hostil, alienígena, de não saber onde está ou por que está ali. Uma boa sacada do autor foi de já nos apresentar uma possível "resposta" para o enigma vindo de uma ideia do vilão, mas esta não ser a verdadeira. Muitos que leram, eu inclusive, são levados a acreditar nesta hipótese por ser a mais plausível até então. Falar mais estragaria a surpresa. Achei a história mediana, com um tema recorrente (coff,coff, Resident Evil, coff, coff, entre outros), e essa questão de ser muito visual a fez perder pontos para mim.
A última história é bem curta, relacionada a eventos que talvez quem conheça mellhor o passado dos WildCats - não é o meu caso - goste e até entenda mais. Não há muito para contar pois não é bem uma história fechada, necessita de algum entendimento anterior. Destaque para a interação entre os personagens, e só. Há pouco mais a ser dito.

O contrário pode ser dito quanto à história de Vodu: a melhor! Na minha humilde opinião, é claro. Alan Moore conseguiu pegar uma personagenzinha fraca e subaproveitada, clichê, e resgatar para ela uma bagagem maior (que o próprio criador da mesma nem sequer chegou a cogitar). Inserindo-a num contexto cultural riquíssimo, redefiniu e norteou toda uma mitologia própria e um background para a Vodu. Uma pena que tão logo a personagem voltou a aparecer nos quadrinhos da editora, tudo isso foi esquecido... Tomando de partida o nome artístico da garota, o mago inglês jogou-a em Nova Orleans e inseriu elementos típicos da religião vodu (não confundir com o voodoo perpetrado por marinheiros ignorantes e supersticiosos e vendido em filmes de terror B norte-americanos), em algumas coisas parecida com a Santería. Para quem conhece um pouco sobre o assunto, as pistas vão sendo deixadas aos poucos pelo autor, nos nomes, nas formas e nos falas das pessoas que a personagem vai conhecendo quando chega à cidade. É estimulante captar e seguir as dicas para tentar descobrir a identidade dos envolvidos.

O início do capítulo 2, Erzulie, mostra o quão poderosas e acima das questões mundanas essas entidades são, e o quanto os seres humanos são apenas marionetes para elas. E é assim que Priscilla, a Vodu do título, passa pela história: nada de super-heroísmo, apenas uma garota sensual (a cena da dança é bem sugestiva!) recém-chegada servindo aos desígnios de forças maiores. Ótima história, sem colantes coloridos, e excelente oportunidade para aprender um pouco mais sobre tão rica e diversificada religião. Uma pena que nesta edição a Panini não tenha incluído todas as capas da minissérie, são muito boas...



Filme sugerido: Identidade (Identity, 2003), com John Cusack.

Conto sugerido 1: The Nine Billion Names of God, de Arthur C. Clarke.

Conto sugerido 2: Last Question, de Isaac Asimov.

Música sugerida: Santeria, da banda Sublime.

Assunto sugerido: religião vodu e voduísmo.

2 comentários:

Jetso Forgotso disse...

Cara, muito boa a resenha/crítica... fiquei realmente interassado. Inclusive nos contos sugeridos. Um abração e até!

Anônimo disse...

Obrigado, que bom que vc se interessou. Acho que todos que gostam de quadrinhos também gostam de ficção científica (na verdade, gostam de uma boa história), daí acho que os contos seriam bem-vindos. Acho legaltambém a questão das histórias em quadrinhos (ou banda desenhada) suscitarem interesse e curiosidade sobre outros assuntos, não só entropia, por exemplo, mas também mitos e religiões como o vodu. E nisso Alan Moore nos agracia deixando-nos ávidos por saber mais do assunto, né? Abraço!