segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A Piada Mortal (de Morrison?)


Explicar piada é uma das piores coisas que existem, mas às vezes isso te revela coisas para as quais você não havia se atentado antes. Na primeira vez em que li a supracitada história de Alan Moore e Brian Bolland, ainda na infância, confesso que inicialmente não entendi a piada que Coringa conta para o Batman e a relação disso com a história.

Relembrando, Batman havia acabado de propor ao Palhaço do Crime para ambos trabalharem juntos, ao passo que Coringa contou a famosa piada sobre dois lunáticos que tentavam fugir do asilo pela cobertura, um deles conseguindo pular até o prédio ao lado enquanto o outro se acovardou. O primeiro, então, liga sua lanterna e propõe ao segundo que caminhe sobre o vão entre os prédios por cima do facho de luz de sua lanterna.
"Acha que eu sou louco? E se você apagar a luz enquanto eu estiver no meio do caminho?"

Meu irmão foi quem, anos depois, me contou que, na verdade, a piada fazia alusão aos próprios Batman e Coringa, sendo Batman o lunático com a lanterna ligada pedindo para Coringa atravessar para seu lado sobre o facho de luz (mais sobre isto no fim do post*).
Daí vem a famosa cena do Homem-Morcego não apenas sorrindo, como rindo, e depois ainda gargalhando ao lado do vilão.
Uma das maiores críticas que eu já vi sobre a história (que é um show de narração, narrativa, transições entre cenas e casamento entre texto e imagem) foram justamente sobre esse final. Como pode o Batman, usualmente soturno e sério como poucos, não apenas sorrir (?) como também rir (??) e ainda por cima gargalhar (???) ao lado da pessoa que acabou de ALEIJAR sua amiga e filha do Comissário Gordon (?!?!) e  ESPANCOU SEU PUPILO ATÉ A MORTE (?!?!?!?!?).
Eis que, nesta semana, no podcast de Kevin Smith sobre o Homem-Morcego, Fatman on Batman, Grant Morrison surge com sua interpretação do final desta história, o que levou a explosões de comentários em fóruns pela internet afora. Talvez pelo revisionismo 25 anos depois de a obra ter sido publicada, seja pela polêmica e impactante visão que sua interpretação dá para o final da obra em si mexendo com alguns dos cânones do universo DC, ou seja pelas impressionantes pistas de que os argumentos que levam a esta interpretação já estavam todos lá no original há um quarto de século, só ninguém não viu até hoje! Ou não quis ver...
Morrison explicou a piada para o incrédulo Kevin Smith e para nós. Uma piada de matar, está lá, desde o título: A Piada Mortal. Segundo Morrison, Batman quebra o pescoço de Coringa e o MATA no fim da história.
Vamos rever a cena:

Reparem que, ao gargalhar, Batman se aproxima e estica o braço em direção ao Coringa (no ombro ou no pescoço?). A silhueta de Batman mantém-se toda negra, no escuro, porém seus olhos e sorrisos sinistramente mantêm-se visíveis, o que juntamente com as orelhas de seu capuz quase parecendo chifres lhe dão um aspecto maligno, quase demoníaco. A "câmera", ou ponto de vista, desce do foco principal da cena e não nos permite mais ver o que acontece com os dois, tampouco com os braços de Batman ao redor do Palhaço. A onomatopeia do carro de polícia chegando começa a tomar conta dos painéis ao tempo em que deixamos de perceber as onomatopeias das gargalhadas, talvez substituindo-as, talvez porque essas cessaram. Percebam que nos três últimos quadrinhos o "EEEEE" pode muito bem ser entendido como um grito, talvez. Os pés dos personagens não se tornam mais visíveis, então não sabemos se Coringa ainda permanece de pé. A luz refletida na poça d'água marca a divisão em polos opostos dos dois antagonistas; porém, no último quadro, esta luz é apagada. Bom, uma das metáforas mais manjadas para o fim da vida é a de uma luz sendo apagada, e o som cessando...
Se formos ler a história atentamente, perceberemos que Alan Moore pode ter plantado esta ideia desde o início. O primeiro diálogo entre Batman e o "Coringa", ainda no Asilo Arkham, já demonstra:
"Sobre o que vai acontecer conosco. No fim. Nós vamos matar um ao outro, não?"

Os negritos em ACONTECER, FIM e MATAR não são meus, já estão nos originais. Bruce ainda conversa umas três vezes com o lunático psicopata, e em todas elas ele faz menção a essa possibilidade: "Não quero que nenhum de nós mate o outro no fim... mas estamos esgotando as alternativas", e também "entraremos numa rota suicida (...) que vai levar nós dois à morte".
Várias coisas me agradam nos autores britânicos de quadrinhos, como Neil Gaiman, Alan Moore e Grant Morrison, e uma delas é o tratamento de cada história como uma obra literária, como arte, e não mero entretenimento, usando e abusando de intercontextualidades, referências, jogos de palavra, metalinguagem, e o uso magistral do casamento argumento e arte. Se Alan Moore realmente queria dar margem a parecer que Batman matou o Coringa no fim da história, parece que ele deu vários indícios sim, e não só no pleno título da história apenas. Nada que o autor já não tenha em outras obras, tais como Watchmen, por exemplo. 
 Um dos aspectos mais importantes dos quadrinhos enquanto mídia, se não o mais importante, é a chamada sarjeta, ou o espaço entre um painel e outro. Diferentemente de filmes, que também são quadros de imagens sequenciais, nas histórias em quadrinhos esta sarjeta é preenchida pelos leitores; ou melhor, por cada leitor, em cada situação em que a lê, interpretando esta passagem de uma imagem à outra com sua visão própria. 
Um bom autor é aquele que consegue contar uma boa história e ainda assim aproveitar o recurso da sarjeta para que o leitor preencha os vazios, gerando sua própria interpretação sem cair no non sequitur. Acredito que Alan Moore, reinterpretado por Grant Morrison duas décadas depois, conseguiu isso.
Pode não ser única interpretação, mas, pra mim, faz realmente todo o sentido, pois prefiro acreditar nisso do que num Batman gargalhando e botando os braços no ombrinho do maníaco sádico e homicida que aleijou sua amiga e matou seu "filho" como era interpretado canonicamente até então.
Por que é tão difícil mexer nesse cânone? Por que tantas respostas exacerbadas contra essa visão? Afinal de contas, o Batman pode sentar ou não pode? Em tempo, o próprio Bolland, coautor da obra e que teve acesso ao roteiro antes de ser desenhado, já havia levantado essa possibilidade desde 2008.
killing-joke-bolland-suggestion
Porém, na internet, estão rolando outras interpretações possíveis para o porquê do som ter terminado e os faróis da polícia terem se apagado. Aparentemente, o que os policiais presenciaram após Batman ter posto a mãozinha sobre o ombro do Coringa foi isso aqui:


* Porém, o melhor da piada é que, no penúltimo quadrinho da história, não é que o farol da viatura refletido na água não forma exatamente um facho de luz? Um facho de luz que depois é... apagado? 
Hein, entenderam a piada, hã, hã?!?

domingo, 11 de agosto de 2013

Super Dia dos Pais

batman liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família
 Sequência de imagens feitas pelo ilustrador Andry Rajoelina para homenagear os heróis da Liga da Justiça levando seus filhos para a escola, como um presente especial neste dia dos pais para os fãs de HQ que já chegaram ou estão chegando nesta fase da vida também. 
superman liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família
aquaman liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família
arqueiro verde liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família
É emblemático perceber que muitos dos "filhos" nada mais são que os herdeiros de tais heróis, muito condizente com a questão do Legado tão fortemente marcado nas histórias da DC Comics. O que nos traz a pergunta: "Será que a nossa imensa coleção que há tantos anos zelosamente guardamos será uma boa herança aos nossos filhos? Eles se interessarão por elas?"

Por outro lado, a imagem do Lanterna Verde levando um filho gerado apenas na força de vontade é bastante melancólica...
lanterna verde liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família

Em contraste, o superacelerado Flash só podia levar seu pimpolho, como não poderia deixar de ser... correndo, é claro!
flash liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família

Para finalizar, mesmo não sendo um pai, não podíamos deixar de mostrar a também icônica Mulher-Maravilha (e mais uma vez a representatividade majoritariamente masculina dos heróis é refletida nestas ilustrações, pois há apenas a imagem de uma heroína): 
mulher maravilha liga da justica Andry Rajoelina 600x600 Liga da Justiça edição família

Na verdade, a resposta para a pergunta que fiz acima pode ser resumida de tal forma: "Talvez eles não se interessem pelas revistas velhas e desgastadas, com folhas amareladas e cheirando a pó e mofo, mas os valores preconizados por estes heróis e suas virtudes serão sim um belo legado a deixar para os filhos".

Feliz dia dos pais!